Tenho irreversivelmente tatuada na retina a fotografia do homem que chora. Não a vejo há vários anos mas conheço de cor cada detalhe. A ruga funda da testa. Uma única lágrima amparada na lente dos óculos. Os cantos dos olhos vermelhos. A pele do rosto manchada. Os cabelos desalinhados pelo vento. O mar ao fundo. A fotografia do homem que chora está guardada dentro de uma pasta, dentro de outra pasta, dentro de uma terceira pasta. Nenhuma tem nome e foram atiradas ao acaso para o interior de um labirinto de memórias inúteis. Mesmo que quisesse, dificilmente a conseguiria encontrar. É a expressão congelada do sofrimento. Um sofrimento que se devolve, como quem estica o braço, abre a palma da mão e diz "Toma. Aqui tens a essência do mal. Agora pertence-te a ti e não mais a mim."
Às vezes sei que essa única imagem que não posso esquecer é a última que verei na vida.
Uma imagem que não se esquece torna-se mito e a maneira que eu vejo de esquecer esse mito-fantasma-passado é recriá-lo, no meu caso, pintá-lo e a cada momento de aplicação de côr diversos e diferentes instantes de pensamento co-relaccionados me surgem e fazem com -- não que eu me esqueça da imagem mas -- que eu a aceite, compreenda o mais possível do facto-imagem e procure caminhos novos que me façam o menor dano.
ResponderEliminarNão consigo pintá-la. Resta-me contar a imagem... :)
Eliminaros homens nã choram... apenas se constipam.
ResponderEliminarÀs vezes choram. Mas sempre pelas razões erradas.
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