domingo, 23 de dezembro de 2018

Estrela do Norte

És a madrugada que atravessa a noite negra
e ilumina a face mais sombria do meu ser.
És o sol de inverno que do alto se alquebra  
e os meus pés nus vem na manhã aquecer.

E és o vento sueste que faz das ondas mau caminho
e sopra aos meus ouvidos este imperfeito bolerinho.

És a porta e a praça da velha cidade a oriente
O jardim de laranjeiras que julgo ter sonhado
O lento render da tarde na lua que se pressente
O tigre, a górgona, o centauro, o cavalo alado.

e és a letra com que todas as estórias se escrevem
e és a pauta onde todas as notas de jazz fervem

E és a água, o vinho, o mel, a pimenta
O rasgo na carne, as veias abertas, o sangue
O travo do mar na minha boca sedenta

O sul para onde as  aves partem
E o norte onde os rios nascem.









segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Diário de Bordo

Este navio chega hoje ao Natal.
As luzes dos chineses já estão espalhadas pelos mastros e agora é esperar que isto não arda tudo. Pendurámos os prisioneiros no cesto da gávea unidos em forma de estrela. Ficou bonito. Com os que nos sobraram, fizemos um presépio vivo em que não nos falta nem a girafa, nem o leão, que o Circo Chen nos alugou a preços de saldo. Não temos menino jesus, mas como tencionamos desmontar tudo a 25, contamos que ninguém chegue a dar pela sua falta. Substituímos o rum pelo vinho quente com canela. Andhriminir, o cozinheiro viking, está desde ontem a treinar receitas natalícias. Polly, o papagaio Pirata, consciente da sua aptidão para sucedâneo de peru, não tem sido visto na cozinha. Os bloggers e os poetas, num raro armistício, andam pelo convés a ensaiar cânticos de Natal. São péssimos. Os ex presidiários, libertos desde que há muitos anos atrás embarcaram neste navio, continuam a cumprir a atávica tradição de passar estes dias a preencher requerimentos para saídas precárias. Álvaro de Campos, é claro, dorme embriagado. Guiliano, o Pirata Italiano, está ocupado a escrever postais de Natal para todas as suas namoradas. Esta vossa tudo menos humilde capitã, que deus-nosso-senhor-nos-livre-de-tamanho-defeito, senta-se finalmente na sua cadeira de pensar e pensa que este ano, antes de aqui chegar, já trazia o Natal no coração. 
(de seguida, é claro, vomita o cliché)  

domingo, 16 de dezembro de 2018

Death makes angels of us all

Wow, I'm sick of doubt 
Live in the light of certain 
South Cruel bindings. 
The servants have the power 
Dog-men and their mean women 
Pulling poor blankets over 
Our sailors I'm sick of dour faces 
Staring at me from the tv Tower, 
want roses in 
My garden bower; dig? 
Royal babies, rubies 
Must now replace aborted 
Strangers in the mud 
These mutants, blood-meal 
For the plant that's plowed. 
They are waiting to take us into 
The severed garden 
Do you know how pale and wanton thrillful 
Comes death on a strange hour 
Unannounced, unplanned for 
Like a scaring over-friendly guest you've 
Brought to bed 
Death makes angels of us all 
And gives us wings 
Where we had shoulders 
Smooth as raven's
Claws 
No more money, no more fancy dress 
This other kingdom seems by far the best 
Until it's other jaw reveals incest 
And loose obedience to a vegetable law. 
I will not go 
Prefer a feast of friends 
To the giant family.

Virá o amor e terá os teus olhos

Sobre o amor, aprendi que deverá ter os mesmos olhos onde quer que esteja.
No amanhecer das ruas de Montmartre; no por do sol do Sena; nas noites escuríssimas de Santiago de Compostela ou nas madrugadas húmidas do Minho. Um amor que se apresenta com os mesmos olhos nas festas de Lisboa ou nas estradas de Queijas. No cansaço, no sono, na alegria. É um olhar único a essência do Amor.

(O título é roubado ao Pavese, que escreveu “virá a morte e terá os teus olhos”.)