Enquanto ouvia a tua música percebi que os anos, em nós, não apagaram quer a sintonia gémea no jazz, quer a incompatibilidade avessa no rock.
Formulei uma teoria:
O jazz pertence à dimensão branca dos sonhos e o rock ao negrume da realidade.
sexta-feira, 30 de janeiro de 2015
Da verdade #1
É preciso dizer a verdade apenas a quem está disposto a ouvi-la.
Séneca, in Cartas a Lucílio
quinta-feira, 29 de janeiro de 2015
Insensatez
Talvez pela justeza do cilício enterrado até às veias, ou pela obstinação com que colecionei as mais irregulares pedras para sobre elas me ajoelhar, ou pela constância da ladaínha interminavelmente debitada sem convicção. E talvez até nunca venha a descobrir porquê, já que insondáveis também são os desígnios de uma consciência inclemente, mesmo, sobretudo, quando é a nossa.
Por fim, fui perdoada.
Pela insensatez.
segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
Dentro da caixa de música
Dentro da caixa de música, a bailarina deu mais duas voltas e dobrou-se numa vénia. Três acordes de piano anunciaram o reinício do mecanismo giratório. Mas antes que a bailarina reerguesse o seu vestido de tule branco, acabou-se a corda.
domingo, 25 de janeiro de 2015
Love not
Não Ames! Não Ames! Oh, desesperados filhos do barro!
As mais alegres coroas de esperança são feitas com flores da terra -
Coisas que são feitas para esmorecer e cair
apesar de terem florescido por umas curtas horas.
Não ames!
Não ames! Aquilo que amas pode mudar:
Os lábios rosados pode deixar de sorrir-te,
Os amáveis olhos radiantes tornarem-se frios e estranhos,
O coração ainda bater com calor, sem que seja verdadeiro.
Não ames!
Não ames! Aquilo que amas pode morrer,
Pode desaparecer da terra da felicidade;
As estrelas silenciosas, o azul e sorridente céu,
a brilhar sobre a sua campa, como antes sobre o seu berço.
Não Ames!
Não ames! Oh, aviso proferido em vão
na presente hora como nos anos que passaram.
O amor atira um halo em torno da cabeça do amado,
Perfeito, imortal, até que mudem ou morram.
Não Ames!
Love not, de Caroline Elizabeth Norton.
Mastigado para português por esta nada vossa humilde serva, na esperança que alguém conheça uma tradução decente de que tenha a gentileza de me dar conta.
A Rainha de Ítaca
Há muitas formas diferentes de se fingir tecer um sudário, fazendo os nós de dia à vista de todos e desfazendo-os em segredo ao cair da noite.
Também a rainha de Ítaca, que passou mais de vinte anos à espera de Ulisses, deve, nalgum momento, ter desacreditado na possibilidade de reunião com o amor. Terá continuado, ainda assim, a travar o fluir da vida com o pretexto de um trabalho que, uma vez perdida a esperança, transformou-se na tecelagem da sua própria solidão.
Nessa altura, sem a âncora da esperança nem o orgulho da fidelidade, também à rainha de Ítaca deve ter-lhe parecido ridícula a sua abnegação. Absolutamente ridícula.
sábado, 24 de janeiro de 2015
Verdon
Fechei os olhos, como mandaste, e vi.
Vi os nossos pés, descalços como os dos escravos, sincronizados numa dança de senzala.
Vi muito ao longe as mãos negras que embalaram os tambores.
Vi a fogueira que brilhou menos do que a lua
e do que o olhar onde acendeste a noite.
Vi a sombra do braço de gigante com que enlaçaste a minha alma,
Vi duas bocas suspensas num milímetro,
A gota de sal que te escorreu da testa,
e se desfez dentro dos meus olhos.
E ouvi, juro que ouvi,
Num sussurro tão próximo
que foi dentro do peito que o som vibrou,
que foi dentro do peito que o som vibrou,
Sometime ago I had a dream
It was happy, it was lasting, it was free
And now in life, oh, can't you see
How we can make that dream into reality?
sexta-feira, 23 de janeiro de 2015
A única forma possível de vida
Treina-se a mente para o espartilho, trilha-lhe o leito fundo do curso dos pensamentos, vigia-se em permanência as margens para que nem uma única gota se desvie. Não há coração que sobreviva ao omnipresente crivo do intelecto. Não é totalmente desagradável viver neste exílio de dor. Poder-se-ia argumentar que também esta é uma forma de morte. Mas não é. Não quando se tornou a única forma possível de vida.
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
segunda-feira, 19 de janeiro de 2015
Blue Monday
Os cientistas das estatísticas avisam que hoje é o dia do ano em que devemos sentir-nos mais tristes. Li por aí que é uma fórmula composta pelas horas de luz, dívidas do Natal, constatação do incumprimento prematuro das resoluções de ano novo, distância temporal relativamente às próximas férias, tudo devidamente potenciado pela paranóia semanal das segundas-feiras.
Eu, que recebi a minha dose normal de luz, tive um Natal financeiramente compensatório, nem me passa pela cabeça cair na asneira de fazer resoluções de ano novo, terei as próximas férias em menos de um mês e há muito que antecipei o drama de segunda-feira para o domingo, mesmo não sabendo que era o dia anual da tristeza, passei-o afundada num azul de profundidade equivalente à cor do alto mar.
Como se não me bastasse ser hipocondríaca e fashion victim, acabei de descobrir que posso bem ser um case studie de acompanhamento inconsciente das tendências sociais.
Diário de Bordo
Morreu Herberto, o escritor octogenário com quem na última primavera mantive um tórrido romance platónico e epistolar.
A notícia chegou-me ao cair da noite quando Gualtiero, o italiano, entrou na minha camarata com um envelope preto com uma caveira desenhada a giz. O meu coração, em tempos tão sincronizado com a mente deste homem, ensurdeceu-lhe de tal forma que confundi a morte anunciada naquele envelope indiscreto com um convite para um baile de uma qualquer organização sindical piratística.
Dentro do envelope havia a última carta que receberei de Herberto e uma breve nota explicativa da autoria da infeliz viúva e provável ideóloga do carnavalesco envelope. Herberto era um homem de excelente gosto e sei que teria escolhido papel machè, mate e em tom creme, para missiva anunciadora do seu óbito.
A viúva não fez qualquer alusão ao envólucro da mensagem e ficarei para sempre na dúvida se traduziu a intenção de uma boa alma de amortecer o choque da notícia, como se o envelope correspondesse ao clássico "senta-te que tenho uma má notícia para te dar", ou se apenas pretendeu vingar-se do marido morto, atingindo-o na sua sobriedade.
Na nota, em que omitiu igualmente qualquer referência à natureza da minha relação com Herberto, a senhora limitou-se a informar-me que o seu marido morreu vítima dos ventos ciclónicos que atingiram a cidade de Lisboa (o que muito estranhei, já que nada ouvi sobre tal assunto nas notícias) e que lhe competia cumprir os últimos desejos do falecido, que, aparentemente, incluíram fazer-me chegar um bilhete manuscrito naquilo que me pareceu ser papel de toalha de mesa (com nódoas de vinho tinto), em letra apressada e quase ilegível.
Herberto, o escritor, sem grandes explicações sobre o fenómeno atmosférico que acabou por lhe roubar a vida, anunciou-me que era improvável que sobrevivesse às próximas duas horas; disse-me que tinha gostado muito de me conhecer e ameaçou encontrar-me na eternidade, onde certamente cuidou reunirem-se condições mais propícias à plena consumação de um amor que esta vida madrasta não favoreceu.
Não vou a tempo de lhe explicar que a minha eternidade está de tal forma cheia de encontros compensatórios das imperfeições desta existência que temo que os dias do tempo total não me cheguem e seja mais avisado começar já a anotá-los numa agenda.
Mais do que ter sido objeto dos quase últimos pensamentos de Herberto, comoveu-me o facto de me ter feito sua herdeira.
No meio daquelas linhas torturadas descodifiquei o seguinte parágrafo:
"Deixo-lhe uma estante cheia de Banda Desenhada, dez livros da Agustina, sob condição resolutiva de que um dia os leia, cinquenta por cento dos meus livros de poesia, correspondentes à metade da minha alma, e vinte por cento da minha discografia de Bach".
Esperava que Herberto me oferecesse em legado as minhas próprias cartas, já que os romances epistolares, além de todas as outras evidentes desvantagens, trazem consigo problemas de indiscrição, dificilmente pensáveis pelos apologistas das SMS.
Sobre isso, Herberto deu uma explicação:
"Saberá a minha amada que a vida de um escritor nestas terras de bárbaros nem sempre permite assegurar a sobrevivência de uma pobre viúva. Leguei à minha mulher as cartas que teve a gentileza de me enviar, devidamente assinadas. Seguro-a, assim, na sua honra".
Herberto era, afinal, um Pirata.
domingo, 18 de janeiro de 2015
Da verdade
The truth will set you free. But not until it finished with you.
David Foster Wallace, Infinite Jest
sábado, 17 de janeiro de 2015
The heart asks pleasure first
O coração pede primeiro o prazer,
E então, o perdão da dor,
E então, esses pequenos analgésicos
Que suavizam o sofrimento,
E então, para ir dormir;
E entao, se essa tiver de ser
A vontade do seu carrasco,
A liberdade de morrer.
Emily Dickinson, tradução de Cuca
“The heart asks pleasure first,
And then, excuse from pain;
And then, those little anodynes
That deaden suffering;
And then, to go to sleep;
And then, if it should be
The will of its Inquisitor,
The liberty to die.”
Foi assim, não foi assim
Encontrei um verso de pontas arredondadas e foi através dele que desci até ao wonderland. São infinitas as possibilidades da poesia.
Depois de o coelho apressado ter repetido o número de fazer de conta que não me reconheceu, procurei a lagarta e sem surpresa fui dar com ela deitada no cimo da folha do costume. Levou o cachimbo à boca e deu uma primeira baforada num profundo silêncio enquanto me fixou com ar mais alienado do que o habitual.
- ainda és Alice?
Tirei do bolso do vestido uma chávena em miniatura, com relevos de flor-do-lis e estendi-lha daquela maneira como se entrega o cartão do cidadão ao polícia que nos vai multar.
A lagarta segurou a chávena com uma pata durante três segundos e depois devolveu-ma sem sequer a olhar.
- chá é na secção V do wonderland. Se pedires com jeito talvez o coelho te convide.
- não vim tomar chá! Vim à procura de respostas.
- estão esgotadas, pequena. Só posso vender-te perguntas. Vai dar no mesmo. Devias aceitar enquanto ainda há.
Percebi que aquilo ia demorar e sentei-me no chão. Por cima de mim havia um arco-íris gigante e fluorescente e vi passar um bando de pássaros de óculos de sol. Uma nuvem cor-de-rosa pastilha elástica demorou-se um pouco mais do que as outras.
- porque é que o chapeiro louco se esqueceu de mim?
Materializou-se na direção da nuvem atrasada o sorriso sarcástico do gato-que-ri.
Ouviu-se um coro de gargalhadas na floresta, mas a lagarta continuou afivelada a uma expressão séria e pensativa.
A cauda do gato-que-ri surgiu do nada e agora todo ele era apenas uma cabeça e uma cauda.
- alfa e omega. Disse a lagarta, como se estivesse triste.
Ao fundo ouviram-se os passos apressados do exército de cartas que caminhava na nossa direção.
Os olhos do gato passaram do verde ao azul e neles cuidei ver o reflexo da baía que me persegue nos sonhos.
- vende-me então a pergunta de que necessito. Disse eu à lagarta em tom de desafio.
- Pode um homem lembrar-se de alguma coisa depois de lhe terem mandado cortar a cabeça?Perguntou a lagarta, aborrecida.
Nessa altura, chegou o exército e aproximou-se um capitão que, assim o quis o acaso, era o às de espadas. Incrédula, vi-o fazer uma vénia na minha direção.
- Majestade: aqui tendes a cabeça do chapeleiro louco. Foi feita a vossa vontade.
O gato que riu desapareceu no extremo sul do arco-íris.
- percebes agora porque é que ele te esqueceu?
Perguntou a lagarta, antes de me apresentar a conta das duas perguntas que comprei.
quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
A página 666
Diz assim, na página 666 dessa que é a minha bíblia, de capas escuras e pesadas, mas de letras feitas de nuvens:
"agora se tivesses alma tinhas de salvá-la, agora
se tivesses génio tinhas de resgatar o pacto, agora
que não tiveste senão quotidiano terás de trazer muita da luz sumida
pelo mundo fora à tua roupa: camisa, calças,
sapatos leves com os pés andando
junto às águas salgadas,
não em cima delas,
com tanta luz no teu passeio distraído pelos acessos à memória,
águas salgadas batidas,
a tua altura medida em espuma contra as fráguas,
agora tens de saber que é falsa,
vens pela babugem como um peixe meio dentro meio fora,
guelras aflitas e o ar enorme à volta para arvoar,
não fossem as barbatanas"
Diz assim, e é verdade.
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
Coisa nenhuma
Sabes, aqueles dias em que o nevoeiro se instala entre o umbigo e o esôfago e é como se os teus passos na rua ecoassem as notas tristes do piano decrépito e curvas-te para a frente como quem melhor acolhe a carga densa do cinzento em ti?
Sabes, aqueles dias em que as gaivotas gritam a dor a que ensurdeceste e o céu fica apenas a centímetros da linha que delimita a tua cabeça e os olhos das pessoas na rua parecem-te terríveis?
E então revês os truques que te ensinaram nas revistas das salas de espera dos curandeiros e aqueles que aprendeste nas noites brancas e começas por imaginar a luz dourada e quente que não te chega a aquecer o peito e recordas versos de poemas lavados de história mas antes do terceiro estás a projetar imagens de uma qualquer infância que deve ter sido feliz e por fim concentras-te nos movimentos do teu corpo e dás precisas instruções aos pés para que se dirijam a casa.
E depois em casa,
Coisa nenhuma, amor.
A chávena partida,
Um lápis perdido,
O relógio parado,
A folha rasgada,
O silêncio da porta,
E até aquela teia.
Coisa nenhuma, Amor.
Sabes, aqueles dias em que a noite nasce na alvorada?
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
O meu livreiro
Tenho um livreiro com a mesma alegria orgulhosa com que algumas pessoas têm um advogado ou um psiquiatra.
Hoje chegou o meu Wallace Stevens e eu fiquei ainda mais contente por ter um livreiro.
Hoje chegou o meu Wallace Stevens e eu fiquei ainda mais contente por ter um livreiro.
Demónios de estimação
Disseram-me que ele estava livre dos seus demónios.
E, embora soubesse não ser verdade, a frase perturbou-me da forma como nos perturba o chão da sala inclinado que esteve ali o tempo todo e nunca vimos realmente até que um dia chegamos a casa e, por qualquer razão, olhamos para aquilo e está lá e nunca mais deixamos de o ver.
Como se, afinal, a explicação nunca encontrada, as respostas não dadas, as motivações não compreendidas, confluíssem todas na simples existência de demónios. Os seus demónios.
E estava, assim, na expressão de outra pessoa, aquilo que os meus próprios demónios me impediram de perceber.
domingo, 11 de janeiro de 2015
sábado, 10 de janeiro de 2015
Inquietação
Só fingimos agradecer a inquietação, assim como se fosse a benção da ave que no último instante evita a morte de encontro aos fios da eletricidade ou de uma papoila que dobra o pescoço para que não se parta durante o ciclone que varre a seara infestada de malmequeres ou do gato que se equilibra nos dez centímetros do parapeito na janela do oitavo andar apenas para ver o mundo do cimo do medo.
Só fingimos agradecer a inquietação porque nunca soubemos viver de outra forma.
Se fossemos capazes entregaríamos de bom grado a asa à algema dourada de um chão aquecido por um forno de pão.
sexta-feira, 9 de janeiro de 2015
En tu abrazo yo abrazo lo que existe
a·bra·ço
(derivação regressiva de abraçar)
(derivação regressiva de abraçar)
substantivo masculino
1. Acto de abraçar, de apertar entre os braços, geralmente em demonstração de amor, gratidão, carinho, amizade, etc. = AMPLEXO
2. Fórmula informal de despedida (ex.: beijos e abraços para todos).
3. [Arquitectura ] Entrelaçamento de folhagens lavradas, à volta de uma coluna.
4. [Botânica ] O mesmo que gavinha.
A definição mais perfeita, como sempre, é a da arquitetura:
Entrelaçamento de folhagens lavradas, à volta de uma coluna. É isso um abraço.
"(...)
En tu abrazo yo abrazo lo que existe,
la arena, el tiempo, el árbol de la lluvia,
y todo vive para que yo viva:
sin ir tan lejos puedo verlo todo:
veo en tu vida todo lo viviente.”
Pablo Neruda in 100 Sonetos De Amor
quinta-feira, 8 de janeiro de 2015
Charlie - odiar o ódio
Liberdade de expressão não se confunde com a liberdade de dizermos coisas bonitas, consensuais ou politicamente corretas. Liberdade de expressão é, sobretudo, a liberdade de expressarmos discordância, repugnância e desprezo. E é ainda a liberdade de satirizarmos os outros e os seus valores mais profundos. As convicções religiosas, quaisquer convicções religiosas, não são mais importantes do que o exercício desta liberdade.
Os que acreditam que os homicídios de ontem são imputáveis ao Islão e os que acreditam que são o justo preço pela ousadia de gozar com o Islão constituem duas faces da mesma moeda. A moeda do fanatismo ignorante cunhada no mesmo material que produziu os assassinos de ontem.
Febre de lua
A lua, plena, derrama sobre todas as praias do planeta idêntica luz.
A cada vinte e nove dias repete-se na areia o desenho das sombras que, na direção um do outro, projetamos em lados opostos do oceano.
E quem nesses dias pudesse ver-nos, do cimo da lua, saberia que cada uma dessas imagens é a metade de uma fotografia que o destino, num dia de raiva, rasgou com os dentes.
Pintura de Megan Aroon Duncanson
quarta-feira, 7 de janeiro de 2015
segunda-feira, 5 de janeiro de 2015
O príncipe arrependido
Por fim, muito tempo depois do teatro encerrado, percebi que a diferença entre co-atores da mesma tragédia - esse abismo entre a tranquilidade, quase placidez, de uns e a inquietação, quase neurose, de outros - justifica-se menos pela distorção retrospetiva de um mesmo passado comum, do que pela capacidade de arrependimento.
Ele soube arrepender-se. E o arrependimento, como caminho alternativo e excludente do perdão , é infinitamente mais libertador.
Tal como Kleist, em o Príncipe de Hamburgo, que disse que o arrependimento é a inocência dos pecadores.
A chave para o retorno à verdejante planície, povoada de coelhinhos brancos da inocência possível, não é o perdão. É o arrependimento profundo.
O imperdoável, nele, é que arrependeu-se para se salvar.
domingo, 4 de janeiro de 2015
Morrer de tédio
Fazemos todo o tipo de ruído possível para silenciarmos o silvo permanente do tédio. Quando tudo o resto se cala, até o silêncio bom, lá está ele sentado à espera, como o esqueleto do nosso rosto devolvido por um espelho terrível. O reverso da vida.
O motor da humanidade não é o amor ou o poder, eles próprios, meros jogos que os homens inventaram para dissolverem o sabor do tédio na língua.
Dir-te-ia, no dia em que faz três anos que morreste de tédio, que o segredo da sobrevivência é a quantidade de decibéis que conseguimos criar em torno do tímpano da alma.
Ensurdecer para calar o silvo que enlouquece.
Que dói como uma chama que nos consome a carne e nos impele a apagá-la, mergulhando nas águas profundas de um rio.
sexta-feira, 2 de janeiro de 2015
Transcendências
Para os não crentes, a transcendência pode ser apenas a auto-estrada em direção ao sul, quase vazia não fosse estar cheia de sol, no primeiro dia do ano, ao som do concerto de ano de novo em direto de Viena.
Subscrever:
Mensagens (Atom)