segunda-feira, 10 de julho de 2017

Diário de Bordo

A esta intrépida tripulação Pirata, durante dez meses por cada ano, não falha a coragem para o sabre ou a ambição para o saque. Lava os dentes com rum, usa com bravo orgulho o tapa-olhos, cultiva um sem fim de pequenas bizarrias desrazoáveis e mantém o coração colonizado pela arte da boa velha pirataria. 
Porém, logo que vê o mês de julho aparecer na folha do calendário, nasce-lhe das entranhas a pavloviana compulsão para se enfiar numa marina portuguesa, daquelas com lojas onde se vendem galos de Barcelos dourados, Nossas Senhoras de Fátima que adivinhem o tempo, porta-chaves com golfinhos e doces de amêndoa fossilizados.
Já levo desta vida de capitã anos suficientes para saber que há tormentas às quais é inútil apontar a proa.
Percebi que era altura de mudar a rota quando a idiotia me entrou pela escotilha mascarada de encomendas on line: colchões insufláveis em forma de lagosta, patinhos amarelos que boiam, cestas com folhos ridículos, barbatanas rosa-pastilha-elástica, pareos de toda a sorte de floreado e caixas de sardinhas e entremeada gordurosa.
Temendo que a própria da Quarteira fosse comprada na internet e entregue no meu navio, anunciei que aportaremos durante os próximos dois meses na marina mais próxima da dita.
Estamos neste exato momento a poucas milhas da costa, à espera que a lua se apague para que possamos fazer uma discreta entrada.
Estes dez-meses-por-ano-intrépidos-Piratas, aproveitam os dias de espera para encherem os insufláveis, montarem as fiadas de flores que tencionam usar ao pescoço  e desenharem escorpiões e osgas de hena em todas as partes do corpo.
Eu...bem... leio o Livro da Selva, de Kipling, lamento-me por em vez de ter ido para pirata não ter antes seguido a carreira de exploradora de tribos selvagens e sonho com as doces cores do outono.

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