É fácil, demasiado fácil, dir-me-ias, jurar o ateísmo e mofar com a transcendência, vivendo-se rodeado de relíquias.
Um sari indiano que viu demasiadas coisas até chegar às minhas mãos. O búzio que semidesfiz entre os dedos. Uma folha de cartolina pintada de vermelho com ondas esculpidas a tinta prateada. Os restos de uma caixa de música e respetiva bailarina aprisionada que salvei das cheias. Uma pobre e velha edição da Ilíada com um coração desenhado a esferográfica durante um voo intercontinental.
Procura-se a salvação tacteando coisas com o fervor da beata que desfia rosários. Consegue-se até, com esforço, engolir a cisma das energias congeladas nos objetos que, dir-me-ias, representam a mesma iconoclastia dos santinhos na mesa de cabeceira.
Terias razão. Não há diferenças significativas entre a entrega da esperança à ineficácia dos deuses e a absorção do desespero na impotência dos mortos.
Mas onde falham os deuses, sobram-me os mortos.
Nietszche diria que a razão é comum. Já Borges, recorreria às sagas nórdicas para deixar a ideia de que a solução se alcançará pelo Ragnarök.
ResponderEliminarBorges tem sempre a única solução que eu estou disposta a validar. :)
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