domingo, 28 de setembro de 2014

Os Maias


Por mais que me esforce para acabar com estes hábitos burgueses a bordo do navio, é um facto que o reflexo condicionado do tédio próprio dos domingos à tarde sobrevive à imposição de uma jornada sem dias de descanso.
Em sofrimento, a minha tripulação veio pedir-me autorização para improvisar um cinema no convés. Acedi sob condição de ser estritamente proibido comer pipocas, chocolatinhos, batatas fritas e todas essas coisas que transformaram as nossas salas de cinema num calvário de ruminação e cheiro a cantina, a tal ponto que uma boa oportunidade de negócio parece-me ser salas de cinema onde seja proibido comer.
Fizemos um referendo e decidimos, quase democraticamente, piratear Os Maias.  (A meio da eleição decidi enviar SMS insidiosas a fazer campanha por este filme, que, associando o amor à desgraça, contribui para o favorecimento da minha causa).
 Como ainda não há salas de cinema espalhadas pelo alto mar, fizemo-lo sem sombra de culpa. 
Álvaro de Campos fez uma prelecção introdutória sobre a narrativa que só interessou a Gualtiero, o Italiano, o único que não foi obrigado a ler o livro. Os ex reclusos nunca passaram do nono ano mas, sendo certo que além da spanish inquisition, dos impostos e do Natal, também ninguém escapa aos Maias, foram obrigados a lê-lo na prisão, à troca de saídas precárias.
Não sou crítica de cinema e, por isso mesmo, limito-me a dizer que gostei muito do filme, que aquilo dos cenários pintados até acaba por ter alguma graça e que todos, sem exceção, têm interpretações de grande nível.
No final do filme ocorreu-me, com algum desalento pela falta de originalidade da vida, que então, como agora, o drama do amor impossível resolve-se exatamente da mesma forma. Carlos da Maia fez uma longa viagem. Maria Eduarda casou-se. 

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