
As estrelas só têm interesse porque nos provocam sensações agradáveis. Ninguém se põe a contemplar o céu com o mesmo propósito doentio com que algumas pessoas param para assistir a tragédias automobilísticas.
Há uma lista de assuntos sobre os quais não deve falar à mesa, nem que para os evitar se veja na contingência de ter que encher a boca de comida e sair da festa com mais dez quilos.
Aqui fica:
Se em desespero de causa tiver mesmo que falar em doenças – cenário que só é concebível num encontro de médicos workaholics ou de pessoas geriátricas – permita-se os seguintes estados patológicos: jet lag (por motivos óbvios), gota (doença historicamente reservada à nobreza), sonambulismo (dá sempre um certo ar de mistério), paludismo (significa que saiu de Portugal pelo menos uma vez na vida) e aquele pulso que partiu numa queda a cavalo ou nas últimas férias da neve.
- Política
Discutir programas de partidos políticos é ainda mais grave. Em primeiro lugar, os seus convivas não os leram (sim, mesmo que sejam deputados), em segundo lugar, você não o compreendeu e, por último, se tiver o azar de estar lá alguém que perceba do assunto, essa pessoa será suficientemente presunçosa para fazer questão de o humilhar em público.
Se adormecer à mesa e acordar no meio de uma acesa discussão política, faça um ar inteligente e diga que prefere falar da política interna do Butão que, isso sim, constitui uma ameaça para o sistema bancário da Suiça que, obviamente, é o único que lhe interessa.
- Guerra dos sexos
Não há nada mais irritante num jantar social do que apanhar com o anormal do lado a debitar teorias machistas sobre a inferioridade feminina quando todos os presentes sabem que além de se arrastar atrás de uma messalina de condição inferior é casado com uma mulher que manda nele. Os sorrisos amarelos das senhoras presentes não são sinal de concordância. São o equivalente educado ao “don´t feed the troll” que é o mesmo que dizer “nem abro a boca para ver se o palhaço se cala”.
Por outro lado, associar-se a um bando de fêmeas excitadas a desancar na espécie masculina, também só a fará parecer uma galinha com a cabeça cortada. Se estiver acompanhada todos pensarão que o seu marido a engana. Se estiver sozinha todos perceberão que o seu ex marido a enganou.
Também aqui, o silêncio dos cavalheiros não significará concordância. Mesmo que a olhem com ar solidário saiba que estão a pensar “o que tu precisas, sei eu o que é!”.
Se for confrontada com uma guerra dos sexos iniciada por um conviva mal-educado, abstenha-se de participar na conversa e diga qualquer coisa espirituosa como “E o que acham dos hermafroditas?” ou o menos sofisticado mas igualmente eficaz “isso era no tempo em que éramos todos macacos”.
- Críticas às profissões dos presentes:
Dizer que os juristas são vigaristas não lhe vai resolver o problema de continuar a ser vigarizado. Vai obrigá-los a enganarem-no naquela mesma conversa com argumentos falsos.
Dizer que os jornalistas são mentirosos e difamam as pessoas será meio caminho andado para que nunca falem de si na altura em que lhe dava um jeito enorme uma entrevista de duas páginas.
Se forem pastores, designers, pasteleiros, filósofos, escritores ou professores, aplica-se a mesma lógica.
Aprenda que os membros de uma classe profissional não são uma espécie de livro amarelo em que pode despejar as suas reclamações, as da sua família, as dos seus amigos e as da senhora que ouviu no programa das tardes da Júlia. Além disso, noventa por cento das pessoas fazia outra coisa se pudesse ou soubesse e tem pelo menos o dobro das queixas contra pessoas da sua própria classe profissional.