Quando a rotina dos teus dias te
ensopa os ossos olhas para a tua vida com desdém. Sentas-te num sofá comprado
na loja sueca e imaginas o que serias se tivesses escolhido o caminho da
esquerda. O do coração. Nos sonhos nunca se sente a falta do que já se tem. É
por isso que o caminho que não escolheste tem o suave aroma das figueiras num
fim de tarde de sol. Então tornas-te vítima do teu logro e finges que estás a
tempo de voltar atrás. Móis a decisão durante uns dias, juntas-lhe três doses
de otimismo e regas tudo com um copo do teu melhor whiskey. É nessa altura que o meu telefone toca.
A tua voz nas minhas sucessivas
salas soa como uma nota de constância confortável. Mais ou menos como a
paisagem do quadro que arrastamos pela vida fora e vamos pendurando em paredes
diferentes. Descreves-me como seria o mundo se tivesses escolhido o caminho da
esquerda. O do coração. Transponho-me para a tua ilusão com a certeza que
durará o tempo de um sonho. Alugas-me pelas horas indispensáveis ao regresso ao
cruzamento em que tornarás a escolher o caminho da direita.
Presto-te o serviço da fantasia
da liberdade que tu me pagas com a fantasia de uma vida normal.
E não admira nada que, para encenarmos
o próximo ato desta peça esgotada, tenhamos escolhido por palco um sítio
chamado Pensão Amor.
Cuca, cuca (suspiro) (e um acentuar do descair de ombros)
ResponderEliminarCuca, Cuca...
ResponderEliminar(caramba, que havemos de fazer com esta miúda?...)
pronto, pronto...
ResponderEliminar...eu fico em casa quieta...
(olhar envergonhado)