domingo, 4 de março de 2012

Os glamourosos domingos de Cuca

Aqui de onde vos escrevo, tal como todos os outros dias da semana, também os domingos são incrivelmente chatos.
Burilei um plano contra o enlouquecimento do qual faz parte a actividade física.
Só a insistente obsessão pelo cumprimento dos meus próprios planos – e também um estranho cheiro a queimado que bem podia significar que a sala tivesse ardido durante a noite – me fez levantar da cama hoje de manhã.
A intenção de correr na praia foi imediatamente anulada por uma inconveniente maré que engoliu o areal com o exclusivo intuito de me prejudicar. O plano subsidiário de tomar o pequeno-almoço em frente ao mar foi imediatamente destruído pelo facto de o dono do único café que reúne tais condições não ter nascido com a minha persistência no combate ao enlouquecimento e não se ter conseguido levantar da cama.
Desde que aqui cheguei já vários perderam o juízo. E constato com tristeza que é entre a malta da restauração que a depressão tem feito o maior número de vítimas, o que contribuiu para diminuir a minha qualidade de vida e aumentar proporcionalmente as minhas próprias dificuldades em manter a sanidade mental.
Na falta de alternativas, deprimi-me em frente a um porto onde duas ou três famílias ditas normais saiam com as suas embarcações de recreio para um dia de domingo. Depois fui-me deprimir de encontro a uma montanha, não sem antes ter deprimido amarguradamente atrás de umas lentas vacas que faziam o seu caminho na direcção de um novo pasto.
A ideia de as vacas terem uma vida mais animada do que a minha já que, pelo menos, a cada semana mudam-nas de sítio, quase me provocou um ataque de choro. Mas aqui, entre muitas outras coisas que me são proibidas, conta-se esse último reduto de liberdade humana que é apoiar a cabeça na palma da mão e chorar muito.
No final do dia a maré devolveu-me a praia.
Mas a promessa do novo dia estava transformada no cumprimento de outro dia requentado.

Foi então que decidi voltar para casa e testar os meus limites com a audição insistente da Lacrimosa de Mozart.

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