sábado, 19 de março de 2011

Do sofrimento

Não sei de onde veio a hedionda ideia de que o sofrimento é um processo necessário na elevação humana. Dir-me-ão que são resquícios de moral judaico cristã mas não me parece que possa concordar. Também há disso nas outras religiões e filosofias. O budismo, por exemplo, está impregnado dessa ideia criminosa. E nem a amoral mitologia grega conseguiu escapar ao facilitismo de justificar a tragédia com a prossecução de um bem maior.
O sofrimento como factor de edificação da alma é uma mentira tão velha quanto cruel.
A maior parte das genuinamente boas pessoas que conheci na vida tiveram existências absolutamente virgens de dor e contrariedade.
Em contrapartida, não me lembro de ter analisado nenhuma atitude monstruosa que não tivesse sido antecedida por um rol de desgraças.
O mal - de que o sofrimento é mera subespécie - é melhor catalisador na deformação do carácter do que na purificação da alma.
A mim, que nasci com a generosidade indexada ao nível de satisfação pessoal, nunca nenhum sofrimento produziu o efeito secundário de me tornar uma pessoa melhor.
E aviso já que, nem que seja apenas para demonstrar a minha tese, enquanto durar esta crise, tenciono manter-me o mais detestável de que for capaz.

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