quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O bolero dos surdos


Mantinham uma relação tripartida em simétricos e perfeitos terços de amor, respeito e raiva. 
Sabiam que estavam juntos há muitas vidas. As células têm uma memória desenganada que se desprende do fio da razão. Paradoxalmente, nenhum dos dois acreditava nas múltiplas possibilidades da reencarnacão dos homens. 
O estranho equilíbrio instalava o lar na convicção de uma existência anterior destruída pela mão do outro. 
Amavam-se com desconfiança. Era um jogo de vida ou morte.
Um dia, cumpririam as suas sortes de mútua aniquilação. Até que não restasse um rasgo de pele.
E depois voltariam à terra, à mesma margem de um rio cansado, perpetuando esse tango infinito de rosas cuspidas e facas apontadas. 
Ao coração.

2 comentários:

  1. “Sobre las mesas, botellas decapitadas de «champagne» con corbatas blancas de payaso, baldes de níquel que trasuntan enflaquecidos brazos y espaldas de «cocottes».
    El bandoneón canta con esperezos de gusano baboso, contradice el pelo rojo de la alfombra, imanta los pezones, los pubis y la punta de los zapatos.
    Machos que se quiebran en un corte ritual, la cabeza hundida entre los hombros, la jeta hinchada de palabras soeces.
    Hembras con las ancas nerviosas, un poquitito de espuma en las axilas, y los ojos demasiado aceitados.
    De pronto se oye un fracaso de cristales. Las mesas dan un corcovo y pegan cuatro patadas en el aire. Un enorme espejo se derrumba con las columnas y la gente que tenía dentro; mientras entre un oleaje de brazos y de espaldas estallan las trompadas, como una rueda de cohetes de bengala.
    Junto con el vigilante, entra la aurora vestida de violeta.”

    Oliverio Girondo, Milonga, in “Obras completas"

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    1. As auroras vestidas de violeta, são o cenário de sonho dos boleros dos surdos. Obrigada pelo Girondo, mil.

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