quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Diário de Bordo

Tal como era previsível, a pobreza voluntária a que nos submeti depois de transformar todas as nossas riquezas em dólares e ir para Nova Iorque cumprir a heróica missão de gastar tudo, teve a virtualidade de nos libertar dos insuportáveis vícios burgueses que já ameaçavam afastar-nos da nossa principal razão de ser que, entre tantos banhos de sol no convés, sessões cinematográficas, greves e jantares gourmet, convém lembrar, é aterrorizar o mundo e dominar os mares.
Reunimos-nos ontem para comemorar o dia internacional dos direitos do homem, coisa para a qual nos estamos todas nas tintas, afinal somos Piratas, mas que comemoramos na mesma para exercitar o cinismo e a hipocrisia e para angariar atenuantes para o improvável caso de um dia virmos a ser julgados pelos nossos crimes. 
Fizemos um arraial no convés com aquelas luzes das festas do Santo António de Lisboa, em que não faltaram manjericos e sardinhas assadas e nem sequer uma marcha popular horrivelmente cantada pelo Álvaro de Campos, o engenheiro. Por ele teria cantado outras vinte, mas os tripulantes ex presidiários, por razões que não imagino quais sejam, exercem sobre ele o estranho poder da neutralização através de um simples olhar de relance. Espero que não andem a violar direitos humanos. 
Poder-se-ia estranhar a forma escolhida para a comemoração, já que estamos em dezembro e não em junho, mas a verdade é que nessa altura, ainda esmagados pelo peso da riqueza, estávamos demasiado apegados ao nosso estatuto "noveau riche" para nos podermos dar ao luxo de um divertimento que na sua designação inclui a palavra "popular". Também por isso, fiz muito bem em esvaziar os cofres e obrigar-nos a todos à pobreza.
É uma pena que a minha tripulação não partilhe das minhas qualidades visionárias e mantenha uma irritante atitude de cobrança e amuo perante a drástica alteração no nosso estilo de vida, insistindo em incompreensíveis e ultrapassados conceitos capitalistas vagamente relacionados com a acusação de também ter gasto o dinheiro dos outros. No entanto, já disse alguém que agora não sei quem foi mas que poderia ter sido meu amigo, que o poder é um lugar muito solitário.
Claro que os custos da festa de comemoração do dia internacional dos direitos do homem nos levaram o que sobrava para os festejos do Natal. Confrontada com esse problema demorei exatamente dois segundos a encontrar a solução evidente: 
Pois se não temos dinheiro para o bacalhau, assaltemos um bacalhoeiro!



2 comentários:

  1. Que mandar e saber mandar é difícil e solitário é tão verdade como o diabo do corrector deste louco iPad que ainda há-de , sozinho , escrever o guião para um número nonsense de standup.
    Assaltemos pois o bacalhoeiro! Penso que ainda tenho um stach debaixo das tábuas do beliche com dois Brise anti bacalhau Sueco ou Norueguês bem escondidos para eventualidades como esta, e também um Oliveira da Serra em spray, que confundi com gas pimenta, mas que ao fim e ao cabo acaba por se tornar útil.
    Pergunta importantíssima : podemos iluminar O mastro da Gávea e cantar o OH Tannenbaum ??

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  2. isto realmente dá um filme :D tou fã, vou ler o resto

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