quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Premonições kitschianas

Também naquele início de Dezembro havia uma ilha e muitas vidas atrasadas por um aeroporto fechado devido ao mau tempo.
O vinho superou em muito a qualidade da comida e nós continuámos sentados a adiantar as horas numa tortura conjunta amplificada por um programa de karaoke.
No final da noite, ele subiu ao palco e eu apostei cinco euros no My Way do Frank Sinatra.
Quando pegou no microfone e anunciou que a música era minha paguei a aposta ainda antes do primeiro acorde.
Numa voz impossível e com expressão de sofrimento ouvi-o cantar em sotaque brasileiro:



tou fazendo amor com outra pessoa,
Mas meu coração vai ser pra sempre teu…



O kitsch ficava-nos muito bem.
Eu ri-me muito. Ele também se riu. Em nosso redor vinte outras pessoas riram-se com ainda mais vontade.
Jamais uma confissão pública de infidelidade foi tão confundida com uma declaração de amor.
Talvez por nunca me ter interessado pela gramática, naquela noite, não consegui perceber que nesse presente do indicativo seguido de um futuro imperfeito estava contida toda a verdade da nossa existência.



“E depois acabou uma ilusão que eu criei, a emoção foi embora e a gente só pede para o tempo correr, lá, lá”

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