segunda-feira, 6 de abril de 2015

Nocturno

A colina é nocturna, no céu claro.
Nela se enquadra a tua cabeça, que mal se move
e acompanha o céu. És como uma nuvem
entrevista pelos ramos. Ri-se-te nos olhos
a estranheza de um céu que não é teu.

A colina de terra e folhas encerra
com a sua negra massa o teu olhar vivo,
a tua boca tem a prega de uma doce cavidade
no meio das encostas distantes. Pareces brincar
à grande colina e à claridade do céu: 
para me dares prazer, repetes a paisagem antiga
e torna-la mais pura.

             Mas vives noutro lugar.
O teu terno sangue fez-se noutro lugar.
As palavras que dizes não têm comparação 
com a tristeza áspera deste céu.
És apenas uma nuvem dulcíssima, branca,
que uma noite ficou presa nos ramos antigos.


Cesare Pavese, Trabalhar Cansa, Livros Cotovia, 81

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