sexta-feira, 29 de julho de 2011

slow down

JP Simões & Luanda Cozetti - Se Por Acaso

A décima quarta casa

Medusa não poderia ter descrito melhor aquilo que foi o espírito desta décima quarta casa plantada no espaço surrealista do tempo da não existência.
Um mundo encantado em que conviveram pacificamente príncipes, princesas, jograis, dragões, ogres, anões e duendes, osgas e grilos. E ainda algumas bruxas.
Tudo, no tempo em que os animais falavam.
Ontem o nevoeiro levou a melhor sobre o farol, apagou a planície e impôs sobre a noite uma cortina tão espessa que me obrigou a encontrar aos apalpões o caminho de casa.
Sei que são eles a lembrarem-me que está esgotada a moratória que me foi concedida no país das maravilhas. Os ecossistemas do fantástico convivem com os elementos alienígenas, mas apenas durante um período limitado. Depois, é preciso escolher-se entre a absorção e a expulsão.
Não pode ser de outra forma.
Alice terá de beber a mágica aguardente de medronho que lhe deram os velhos da praça, recuperar a sua estatura normal e sentar-se à mesa dos adultos a tempo do jantar de domingo.
Apesar de à entrada me terem avisado que nada poderia levar deste mundo, decidi quebrar a lei da intangibilidade. Passei cinco meses a aumentar os tecidos do coração. Para que nele caiba, escondida, a imensidão da planície.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

bird watching

pois podia escrever sobre tanta coisa.
a relva fresca que me emoldura os pequenos-almoços tomados na pérgola da minha casa.
das virtudes do cedo deitar para cedo erguer. a felicidade das manhãs.
o marisco. a limonada na praia.
os figos a pingar mel.

mas que se dane. estou a apodrecer de preguiça pelo que a única coisa que faço a partir da minha sunbed para além de sun bathe é bird watching. e dá cá um trabalhoooooooo...

quarta-feira, 27 de julho de 2011

O desesperado movimento das estações

A chuva lava. Mas o sol seca. Entre a lama e o pó prefiro o último.
Disfarça-se melhor.
És tu essa areia indesejada que continuará para sempre agarrada aos meus pés nus.

terça-feira, 26 de julho de 2011

rehab



areia na minha british Vogue com o avanço da temporada. casacos de pele e botas de cano alto com cheiro a protector Lancaster.





o cruel dilema entre pintar as unhas dos pés em Red Massaï ou Vineyard.





figos a pingar mel.





mar gostoso...





ampliação da colecção de havaianas. é sempre um investimento seguro para quem não calça outra coisa all year round.





ando a rir-me para as coroas de rei. estão fantásticas.



e o ALA, sempre o ALA a enlouquecer-me.





meu nome é Medusa. deixei o Lex. já consigo andar a fazer nada.


sábado, 23 de julho de 2011

debaixo do chaparro de klimt



nas franjas da Terra, iluminadas por faróis de luz rodopiante, vive-se como na pista 8 do tartan de atletismo – por mais que se corra vai-se sempre mais devagar que os outros, os das pistas 1 a 7. pelo que um acaba por habituar-se a não o fazer. de princípio, trota. quando encharcado de planície, caminha. devagar. acaba por sentar-se. e passa a preferir enxugar, em partilha com um amigo, a garrafa que magicamente flutua do freezer para os copos no chão, ao pé do sofá.

feliz.
foi assim que encontrei a Cuca.
de linhas apagadas - não que os poucos anos tenham sulcado o seu rosto, mas mais dormida e letárgica abria ainda mais o sorriso já grande, até fechar os olhos.


nas horas que passámos juntas, que por pouco não atingiram a centena, rimos meses e conversámos anos. a quatro braços foi mais fácil fechar portas de sótãos empoeirados e dolorosos e abrir à picareta novas janelas para a vida, daquelas que deixam entrar o sol para dentro da alma.


tudo sem grandes beijos nem abraços (que ambas dispensamos…).

partilhámos a autoria de um assassinato, deveras chocante para a comunidade de grilos da povoação. comunidade que se demitiu de cantar na noite que se seguiu ao massacre em exéquias à desgraçada (então já viúva) do casal de monstros que viveram atrás do sofá da sala. coerentes com o facto de apenas reciclarmos quando estão a olhar-nos, lançámos mão de armas químicas no escuro daquela noite. também não dispensámos o uso de grande violência.
o corpo esquartejado desapareceu, como por magia, da praça onde o deixámos. passámos o resto dos dias a temer uma vingança em bloco dos insectos da planície o que, por ora, não aconteceu.

levantámos em uníssono os respectivos sobrolhos esquerdos quando, na ideia de ir visitar uma fábrica de chocolate, nos achámos numa cozinha no topo de um barranco que quase arruinou os nossos saltos. gastámos 12 euros e cuspimos às gargalhadas os quadrados temperados com gengibre – (querida, espera até comeres uns em forma de pirâmide…). sítio querido, chocolates muito gostosos, mas que não resistiu à nossa ironia compulsiva. assim ali como o resto do Mundo – não poderia escapar.

atolámo-nos em marisco de tal forma que acho que pelo resto deste Verão vou dedicar-me às churrascadas.

assinei com a BIC laranja que comprei no quiosque da praça o atestado de insanidade da Cuca - aconteceu quando o israelita da Mossad apareceu a cavalo. aproveitei e obriguei-a a assinar o meu, que ficou muito feio e tremelicado pelas gargalhadas com que fazia baloiçar a casa. descobri que certas pessoas aparecem aos outros em câmara lenta, como nos filmes. é mesmo real. ambas as crinas – as do animal e as do animal que montava o animal, ondulavam ao vento e emolduravam um sorriso de mil searas ao sol.
nem palmas deu para bater pois fiquei muito gaga. e eu não sou de gaguejar.

entretanto, a areia das praias onde apanhámos banhos de sol juntou-se toda na barriga de baixo da ampulheta.


feliz.
foi assim que deixei a Cuca.
a sorrir muito, na sua praça de far-west. tal era o vagar do seu sorriso que, juro, vi crescerem raízes que agarravam os seus pés à terra daquele local. acho que que a minha amiga já não mora lá – está plantada.

na bagagem, um projecto comum. inexequível como a nossa própria vida vista do passado: vamos voltar. para viver num monte de cuja porta se pode ver a casa toda. e dedicar-nos à bruxaria. fiquei de levar as sementes de reineta.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Eu não sei de onde sai tanta gente a precisar de um coração

Fui acusada de fingir o amor
à conta de umas mortes por aí,
mas eu garanto que não fiz mais que cantar;
e agradecer as flores que recebi.

Porém há tanto homem infeliz
que necessita de muita atenção,
depois confunde tudo o que se diz e vai
embriagar-se por qualquer razão.

Eu não sei de onde sai
tanta gente a precisar de um coração
que me toma por um anjo,
nem pergunta se eu desejo
a sua afeição.

Foi nessa noite tensa de luar,
a casa quente e cheia a gritar "Bis!"
que o americano entrou louco no camarim
impondo "I've gotta have you! You're my star!".

Eu recusei, não gosto de patrões,
ele jurou que me ia arrepender;
disse que comandava mais de 100 nações,
que o mundo inteiro iria estremecer.

Eu não sei de onde sai
tanta gente a precisar de um coração
que me toma por um anjo,
nem pergunta se eu desejo
a sua afeição.


Lili & o Americano, 1970, JP Simões

Não ficou nada




“We´ll always have Paris” traduz uma mesquinhez e um apoucamento de espírito que podem servir a sonsa da Ilse mas que, no que me diz respeito, parecem-me especialmente desprezíveis.
Além disso, não nos lembrámos de ir a Paris ou a qualquer outro lugar suficientemente pretensioso para encher, sequer, meio cliché.
Assassinámos os lugares comuns.
Nós não teremos nada. Para sempre.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Uma aventura na planície

Incapaz de resolver sozinha o mistério do faroleiro e das coisas que, nesta terra, nunca são o que parecem e com os dias a esgotarem-se, decidi chamar reforços.
Foi então que Medusa chegou à casa na pradaria...

outros caleidoscópios

domingo, 17 de julho de 2011

sexta-feira, 15 de julho de 2011

uma casa na pradaria

- Já experimentou varrer as formigas antes de as tentar matar com biokill?
- Já. Mas a história está cheia de condenados ao exílio que regressam e arranjam problemas. A pena de morte é mais eficaz.
- Não devia dizer esse tipo de coisas…
- Ainda estamos a falar de formigas, não estamos?
- Sou um homem do campo. Não gosto de ver matar bichos. Especialmente aqueles que são resistentes, organizados e lutadores.
- Pois, pois. E que se infiltram dentro da casa das pessoas sem ninguém os chamar…
- Não se arme em santa. Se aqui apareceram é porque fez qualquer coisa para as atrair.
- Eu? Estava aqui sentada quietinha a ler o meu livro quando você apareceu montado no seu cavalo.
- Já não estamos a falar de formigas, pois não?
- Ainda por cima cheira a cavalo.
- Tendo em conta que vim de cavalo, se cheirasse a cão é que seria um fenómeno.

crucificadíssima

Das despedidas (mais uma outra vez)

Não há tarefa que a prática não aperfeiçoe.
Desta vez, não me acantonei cobardemente no meu gabinete à espera que o edifício se esvaziasse para, finalmente, fazer uma deprimente marcha do adeus, durante a noite e sozinha, pelos corredores vazios de gente até à sala reduzida à sua real significância.
Também não lhes dei oportunidade de me encurralarem numa visita surpresa colectiva, apanhando-me entre dois telefonemas e um e-mail, dentro daquele espaço onde, por ser a minha área de segurança, mais facilmente me conseguem fazer deslizar para a proibidíssima exibição de emoções.
Fiz os exercícios respiratórios que me ensinaram, tranquei no rosto um plácido sorriso Gioncondiando e caminhei segura e decidida até aos lugares deles. Distribuí apertos de mão, agradecimentos pela infinita paciência, votos de um resto de vida cheio daquilo que lhes apeteça e a coisa correu-me tão bem que ainda consegui ameaçá-los com o meu regresso.
Depois, terminei como sempre me disseram que deveria ter começado.
Entrei na sala grande e, invertendo posições, sentei-me no lugar que destinam àqueles cujos destinos me entregam.
É um exercício perigoso e pouco recomendável a quem nasceu com a limitação da incapacidade de acreditar na milagrosa orientação divina.

Ao contrário do que dizem, só deve ser feito à saída.
Abandonei o edifício, em paz comigo própria e convencida que, apesar de tudo, este ano falhei menos.
Agora, que este povo já não é meu e o próximo ainda não me conhece, estou pronta para me estender na praia à sombra da tranquilidade de ser apenas uma mulher.

passagem de ano

Há pessoas para quem, à semelhança do que acontece com as crianças, o ano termina no início das férias grandes.
O nosso ano termina hoje.
À Estrelita e à Medusa para que às zero horas iniciem o melhor de todos os anos.

XBAG





parto carregada. de todas as pessoas bonitas que me aconteceram aqui.



quinta-feira, 14 de julho de 2011

O tal do toque de Midas mas ao contrário

Ninguém erra tanto. Há os limites da capacidade de dissimulação. Uma pessoa percebe estas coisas. Nem sequer existem crápulas a pontapé.
A história da minha vida é uma impossibilidade estatística.
Só aceito uma explicação:
Eles eram todos excelentes pessoas até que nas suas vidas lhes aconteci eu.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

party hard

batalhas



i hope you have a good life


esperei-te todos os dias, todo o santo dia. mesmo quando não estive só.


em todo o lugar onde procurei paz sentaste-te ao meu lado. a sorrir e a pedir para nos rirmos. e o meu sorriso de volta era tão dolorido que chegou a secar todo um largo repleto de jacarandás.



recorre o sonho de uma viagem numa estrada ladeada de verde e a cheirar ao mar que brilha em prata, ao longe. mas não tem fim porque nunca chego à praia. é, pois, um pesadelo.



sei que vou viver o resto desta vida com o teu nó na minha garganta.

e sim. perdi a capacidade de escrever coisas bonitas.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

sábado, 9 de julho de 2011

dos regressos

Pensei que poderia viver sem Puccini e ofereci-o. Descobri que estava enganada e readquiri-o. Quando se oferece uma coisa que nos pertence, comprar outra igual para a substituir é de uma batota imperdoável. Mas em minha defesa devo invocar que ainda não conheci integridade moral que sobreviva a uma necessidade fundamental.


Hoje perdi-me na planície, ao som de Puccini no carro, com a cabeça vazia, os pés sujos de areia e seis livros novos à minha espera dentro de casa.


Afinal, a felicidade compra-se na FNAC.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

regalo


corri toda a Baixa à procura de um presente.


acabei por fazer, eu própria, este fraco origami.



depois percebi que o que realmente gostaria de lhe oferecer era o intervalo entre os dias.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Do tão pouco que ainda interessa




De qualquer forma, ambos sabíamos, sempre soubemos, que ser-me-ia impossível passar todas as noites da minha vida com um homem que não me lesse poemas.

maldições



quando se é um sanatório assombrado é compreensível que fujam de nós. é da ordem natural das coisas.



mesmo quando alberguemos uma alma penada adorável e fácil de mimar.



mesmo que guardemos a esperança e a ilusão num sorriso franco: apesar da redoma partida e depois de se ter descoberto que, afinal, o unicórnio não passava de um cavalo caiado e torturado pelo elástico que lhe segurava na testa um chifre de cartão canelado.

why don't you just go f***ck yourself...?

domingo, 3 de julho de 2011

viuvez aracnídea



sei que nem te importas mais mas... só tu.


só tu colocaste tudo em perspectiva.

Miúdas com muito estilo: Hera

Aristophanes

Animais da planície

O meu senhorio, israelita da Mossad, rapaz com peito para suportar o meu nome inteiro tatuado em times new roman, voltou de Espanha e enviou-me uma SMS.
Quando a abri foi o cheiro da planície que se espalhou por esta sala de cidade, fazendo-a logo parecer mais pequena, mais insonsa, mais formal.
Dizia assim, a SMS:
Temos saudades das suas manias e estamos aborrecidos por não haver mais ninguém com quem gozar. Volte logo.



Ia responder com uma prelecção sobre o respeito que me é devido e a inconveniência das gracinhas tolas.



Mas antes que tivesse tempo de acabar a primeira palavra, já memória da planície tinha dominado o meu cérebro como uma droga de acção rápida.



Carreguei no delete, larguei o telemóvel e fui fazer as malas.



Amanhã volto para a também já minha terra.



...

Apenas um punhado de areia na ampulheta...
...Já de menos para o tanto que ainda faltava acontecer.

sábado, 2 de julho de 2011

Guerras que mais valia ter perdido

O amor é tão exasperantemente aborrecido que até nos contornos do desgosto não consegue oferecer mais nem melhor do que aquilo que já se viveu.
No fundo, é como se o desgosto de amor fosse coisa de que só é possível sofrer uma única vez. Depois do primeiro, todos os outros parecem cómicas réplicas do mesmo sismo.
Há qualquer coisa de hilariante em ver a terra abanar, ter o instintivo medo de que as estruturas se danifiquem e, pelo meio, tomar consciência que já não há nenhuma estrutura para ruir.


Nas réplicas, até a dor tem o entediante gosto da comida requentada.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

cat power: !


would you let me walk down your street
naked if I want to?
can I fire fireworks on the fourth of every single July?
can I buy an amplifier, oh, on time?
my sweet time

well I ain't got no money
i will pay this time
and I ain't got no money
but I will pay you before I die

and would you let me walk down your street
naked if I want to?
can I fire fireworks on the fourth of every single July?
can I buy an aeroplane while i'm high in all the sky?
and I got no mercy
i will pay this time
and I got no mercy
i will pay you before I die