quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

dragged from view



Forty eight thousand seats bleats
And roars for my memories of you
Now that I am clean
The matador is no more and is dragged from view

But something good, oh something good, oh something good
Oh something good tonight will make me forget about you for now



terça-feira, 28 de janeiro de 2014

domingo, 26 de janeiro de 2014

Em nome do povo

Interrompo a minha habitual existência no mundo do etéreo, onde a única coisa que me pode incomodar é um desastrado deslize melódico na ligação entre dois versos, para dizer o seguinte:
Em Portugal a culpa até pode morrer solteira mas vive a sua vida artificialmente inseminada de trigémeos, e parece-me que é precisamente pelo excesso de fecundidade que acaba por morrer, solteira, durante o parto.
A inquisição não foi obra do diabo mas dos homens e encontrou o seu terreno fértil numa certa forma de mentalidade que lhe sobreviveu.
Há em cada Português um juiz frustrado que não cursou direito nem passou pelas cadeiras do Centro de Estudos Judiciários e que, apesar de nunca ter sido nomeado, não se cansa de fazer julgamentos. 
Para esse juiz, que julga sem processo, sem provas e sem regras, o veredicto natural é a condenação.
Esse juiz, que habita a oitava costela do português, não aprende nada com os seus próprios erros. Se aprendesse, retiraria algumas ilações de um célebre julgamento em que, ao mesmo tempo em que condenou os pais ingleses de uma criança desaparecida, conseguiu condenar as instituições que não a fizeram reaparecer. Mas não aprende, porque quando o acto de julgar encontra os seus fundamentos no prazer do sentenciar e não na missão da justiça, os erros não interessam para nada.
Vem isto a propósito de seis adultos que morreram afogados e de um sétimo que anda a ser a queimado vivo na fogueira da inquisição e que, até prova em contrário, o único crime que cometeu foi o saudável exercício do seu direito de se recusar a exibir a sua intimidade em frente das câmaras da televisão. 
Para esse juiz, a equação é fácil. Onde há uma tragédia tem de haver um culpado. Ou não fosse o mundo, tendencialmente, um éden divino que apenas pela ação humana pode ser perturbado. Percebo o conforto da ideia. Afinal, enquanto a culpa for dos homens há esperança. O acaso e a natureza são forças indisciplináveis que gozam com as nossas leis e não temem a possibilidade de acabar os seus dias num estabelecimento prisional. Mandam as regras da cobardia que apenas se escolham inimigos ao alcance da nossa própria capacidade de aniquilação.
Também percebo as famílias das vítimas. À justiça do luto importa, antes de mais, absolver de toda a espécie de culpa própria aqueles que se foram. 
O que não percebo é esse juiz condenador, que pelo mero prazer do sentenciar faz suas as vítimas dos outros e cria as próprias, sem nunca se questionar sobre os efeitos da sua atividade criminosa.






sábado, 25 de janeiro de 2014

Cantigas de Escárnio e Maldizer


Todos Dizem que Deus Nunca Pecou

Todos dizen que Deus nunca pecou,
mais mortalmente o vej'eu pecar:
ca lhe vej'eu muitos desemparar
seus vassalos, que mui caro comprou;
ca os leixa morrer con grand'amor,
desemparados de ben de senhor;
e ja com'estes min desemparou.

E maior pecado mortal non sei
ca o que eu vejo fazer a Deus,
ca desampara os vassalos seus
en mui gran coita d'amor qual eu hei;
e o senhor que acorrer non quer
a seus vassalos, quando lh'é mester,
peca mortal, pois é tan alto Rei.

Todo senhor, demais Rei natural,
dev'os vassalos de mort'a partir
e acorre-lhes, cada que os vir
estar en coita; mais Deus non é tal,
ca os leixa con grand'amor morrer,
e, pero pode, non lhes quer valer:
e assí faz gran pecado mortal

Pedro Gotérrez


Aqui

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Não ser


Sou

Sou o que sabe não ser menos vão
Que o vão observador que frente ao mudo
Vidro do espelho segue o mais agudo
Reflexo ou o corpo do irmão.
Sou, tácitos amigos, o que sabe
Que a única vingança ou o perdão
É o esquecimento. Um deus quis dar então
Ao ódio humano essa curiosa chave.
Sou o que, apesar de tão ilustres modos
De errar, não decifrou o labirinto
Singular e plural, árduo e distinto,
Do tempo, que é de um só e é de todos.
Sou o que é ninguém, o que não foi a espada
Na guerra. Um esquecimento, um eco, um nada.

Jorge Luis Borges, in "A Rosa Profunda"

Ruínas


Só ficou a espuma do mar a bater nas rochas enquadradas pela grande varanda do edifício abandonado. Eramos nós os restos humanos sob o sol da uma da tarde. Os meus pés embrulhados nas silvas e os teus em frente aos meus. Colados. O olhar que se elevou dos graffitis das paredes esburacadas a tempo de surpreender uma expressão desvairada. A tua voz a sobrepor-se à das ondas com uma canção mais desesperada do que pura que desfaleceu num murmúrio, desfez-se nos meus ouvidos, morreu na minha boca. Os braços de gigante que me arrancaram da terra e me embalaram num mundo de fadas azuis de asas feitas do arco-íris. Duas almas e uma rosa entre os dentes a dançar um tango de facas depostas com o tempo já derrotado pela força do teu desespero. Foi o dia em que o mundo encolheu tanto que tudo o que sobrou foram as ruínas de uma varanda sobre o mar, silvas a nascerem-nos dos pés, uma veia do pescoço a exibir as batidas do coração, duas mãos fundidas em algo mais do que pele, carne, ossos, claves de sol do teu amor a caírem sobre uma pauta vazia e a transformarem-se na voz dos anjos. Muito ao fundo.
E nunca fui tão feliz como na tarde em que, pela primeira vez, me despedi para sempre de ti.

We weren't made to be this way



And in the water i could see

A piece of what you broke in me

I took a walk in my usual way

(...)



We weren't made to be this way

We weren't made to be afraid

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

reflexão tolinha sobre o acordo ortográfico

Apesar de não se poder negar ao espectador uma certa capacidade de servir como instrumento perfurante, seria um exagero chamar-lhe espetador.

Não estar

Os saltos altos disfarçam tudo. Finjo os sorrisos ao ritmo do ranger da porta. Na mala um cigarro apagado lembra-me que não existo. As olheiras foram cuidadosamente betuminadas. Para melhor conforto do espectador. E às vezes pergunto-me como seria se pudesse não sorrir ao ranger da porta. Ficar aqui sentada com o cigarro aceso a falar com a mala. Os pés descalços a apoiarem-se um ao outro e os olhos libertos do véu da civilidade. 
Mas os saltos altos disfarçam tudo. 
Até o rio de pensamentos que salta as margens espartilhadas deste banco de areia poluído onde jazemos o dia inteiro.
E inunda o ranger da porta.
E afoga o espectador.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Almas gémeas

... e não temos nada, Senão um ao outro.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Grandes filósofos



  1. Agent K: Do you know what's the most destructive force in the universe?
  2. Agent J: Sugar?
  3. Agent K: Regret.

Exploradores



Once I hoped
To seek the new and unknown
This planet's overrun
There's nothing left for you or for me
Don't give in, we can
Walk through the fields
And feeling nature's glow
But all the land is owned
There's none left for you or for me

Who will win?
(...)

Se não as pessoas, também as vidas podem ser terra possuída. Demarcadas a arame farpado. Sinalizadas em lotes, ruas e números de porta.
Chegámos tarde. 
Quando já não havia terra livre para ser explorada.
Podemos ter gritado em uníssono que,


Free me
Free me
Free me from this world
I don't belong here
It was a mistake imprisoning my soul
Can you free me
Free me from this world

Mas ninguém nos ouviu.
E perdemos todos. Perdemos para a vida. 

Diário de Bordo # 9

A tragédia humana abateu-se sobre esta embarcação corsária. 
Fui tão criteriosa e certeira na escolha de uma tripulação de alma genuinamente Pirata que nem os vícios lhes escaparam. Sobretudo esses.
O último plano era passarmos o final do ano na marina do Mónaco, sequestrarmos todos os novo-ricos que pudessemos e contribuir para os aliviar do seu detestável estatuto tornando-os menos ricos. Era um projeto tão bom e com uma consciência social tão desenvolvida que chegámos a pensar em candidatar-nos a um daqueles fundos europeus de solidariedade social, coisa que só não fizemos porque nos exigiram contabilidade organizada, certificação de qualidade e uma série de outras burocracias pouco compatíveis com a prática criminosa.
Sucede que esta brava gente encontrou nas roletas do Mónaco o mais perfeito catalisador da sua natureza viciosa. Meia hora depois do desembarque, aproveitando-se da minha momentânea distração causada pelo esforço intelectual de conseguir perceber alguma coisa daquilo que o Joyce se pôs a escrever no Ulysses, deixaram-se viciar no vil jogo.
Lá pela página 105 comecei a estranhar o silêncio e ocorreu-me que há seis luas que não punha a vista em cima de nenhum deles. Mas considerando que se interrompesse ali a leitura teria que começar tudo do início, decidi imbuir-me de um otimismo infantil e acreditar que tinham apenas ido em excursão a Cannes inteirar-se do programa do próximo festival de cinema. 
Estava eu selvaticamente a dobrar o canto superior direito da página 183, o que deve ter acontecido mais três ou quatro luas depois da sexta, quando me entraram pelo navio dois chineses empunhando uma ordem judicial de penhora da chaise long Philippe Starck, de cinco barris de rum e do papagaio emprestado.
Os desgraçados perderam no jogo todo o dinheiro que ganhámos com a venda do crude e depois de  ficarem sem crédito no casino começaram a apostar pernas de paus, ganchos, sabres, tapa-olhos, lenços e respetivos animais em bancas de jogo improvisadas no meio da rua.
Lá tive que pousar o livro maldito e ir em busca de uma tripulação que, outrora opulenta, nutrida e vigorosa, encontrei transformada num grupo de maltrapilhos, semi-nus, de olhar lunático e desorientado.
Consegui atraí-los para o navio com a promessa de uma jogatana de poker, trancá-los no porão e abandonar este antro de pecado que nos arruinou a todos.
Agora estou sentada na chaise long que recuperei aos chineses depois de entregar em garantia nada menos que a pequena cutxi e não tenciono levantar-me daqui enquanto não chegar à página 502.
A miséria material é o módico preço da elevação espiritual. 


segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Uma teima

Esta saudade não significa nada e não tem qualquer valor. 
Não é amor. Nunca foi amor.
É uma teima.
Não vale nada. Não nos vale de nada. Não valemos nada.
Apenas uma teima.

A matéria do espírito

A itinerância aliada à falta de espaço obrigaram-me a ficar sem a maioria dos meus livros durante cerca de quatro anos. Os livros são apenas objetos que já cumpriram a sua função e, se pensarmos bem, não há razões lógicas para que a sua ausência nos traga qualquer desconforto.
Os meus livros chegaram este fim de semana.
Senti-me aliviada, como uma pessoa a quem devolveram a sua própria história.

domingo, 19 de janeiro de 2014

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

A hundred thousand butterflies
Floating in the orange skies above my head.
Loosen up and lose your mind
You never know what you could find on the other side.

All of the things that made you feel better
You should write it all down and put it in a letter.

domingo, 12 de janeiro de 2014

Quando a Alma não é pequena, as pessoas são grandes


E o amor não lhes esvai na ponta dos dedos perante as oposições anunciadas pelos astros. E o espírito não se lhes rende à prisão do corpo. E os sucessos chegam-lhes azedos se forem titulares da promissória  das convicções. E a voz far-se-á ouvir mesmo no silêncio gélido da hipocrisia de todos. E quererão o amor e quererão a liberdade e quererão as convicções e quererão o grito. 
Quando a Alma não é pequena, a consequência não é uma moeda de latão que se troque no mercado das venalidades. 

Comunicações Intergaláticas

É irritante que continues a assaltar-me o espírito com a eterna novidade da tua não existência em momentos inusitados. Como hoje, enquanto comia morangos com iogurte grego, em pé, em frente ao balcão da cozinha. Agora há morangos todo o ano. Disseram-me os teus olhos de morto dissimulado, como se haver morangos todo o ano fosse um sintoma de uma sociedade onde nenhum homem de bem se deve resignar a viver. A minha primeira reação foi fazer voar na tua direção uma colher suja de iogurte. O que talvez tivesse feito se não se desse o caso de só ter empregada doméstica dois dias por semana e não fazer ideia do sítio onde ela esconde de mim os esfregões. Aposto que no topo de um armário onde bem sabe que eu não chego. As empregadas vingam-se de nós como podem. Esta abusa do facto de ser muito mais alta do que eu. Com a colher ainda espetada na taça voltei-me para a memória do teu sorriso trocista. Demorou alguns segundos a materializar-se. O tempo é inimigo dos mortos. Rouba-lhes tudo, até a limpidez da memória nos olhos dos outros.
Correu mais um ano sobre o dia em que morreste. Este ano fomos poupados às exéquias públicas do costume e o teu rosto congelado não saltou das páginas dos jornais nem do ecrã do computador, como que a dizer Cucu atrás da esquina da porta. Já te tinha dito, o tempo é inimigo dos mortos. Tu, que tinhas a mania que sabias tudo, deverias ter contado com esse pormenor. Aposto que tem menos graça morrer quando se morre mesmo. Para além do mais, parece-me agora improvável que dêem o teu nome a uma rua. Nenhuma conta da EDP com o teu nome no endereço. Quanto mais uma carta de amor.
Claro que ainda não te perdoei. Claro que até já desisti de algum dia te vir a perdoar. A frase mais honesta que li escrita sobre ti, dizia que deverias ter pensado em nós.
Morreres-nos não é coisa que te possamos aturar. 
Terás que viver com este rancor.

sábado, 11 de janeiro de 2014

Escreveu Joyce, implacável, a propósito do meu último post

"Shakespeare é o feliz couto de caça de todas as mentes que perderam o equilíbrio."

Romeu, esse cobarde.


Unidas por uma causa comum, eu e Estrelita fizemos as pazes e, por uns dias, deixaremos o navio.
Vamos a Verona ao templo de Julieta. 
Cuspir no chão de todas as histórias de amor impossível.

Falsa lágrima pintada de negro, a pender dos olhos.


Também nós encenámos a nossa própria peça para ser desempenhada por Mimos. Foi a forma que encontrámos de não trair a promessa do silêncio recíproco que fizemos a terceiros desprovidos de coração. Em quartos, no teu caso, em salas, no meu.
Colhi ilusoriamente todas as flores imaginárias que me estendeste e respondi-te na mudez da expressão sofrida de cada vénia dedicada. 
Mãos tapadas por luvas brancas. Sentimentos escondidos em bocas trancadas por lápis de maquilhagem.
Durante incontáveis meses. Sexta-feira após sexta-feira.
Mas os Mimos continuam a ser apenas uma versão dos palhaços. Porventura mais grotescos, ainda, com aquela falsa lágrima, pintada de negro, a pender dos olhos. Sempre tristes.
E eu sofro de colourfobia.
Foi por isso que uma sexta-feira decidi abandonar o teatro, deixando-te sozinho no palco, de mão estendida, costas arqueadas, flor imaginária sem quem a colha e olhos verdadeiramente tristes por cima de falsa lágrima, pintada de negro.
À mudez imposta, juntei a surdez voluntária. À tua música. Que ainda toca todas as sextas-feiras, mas que já não toca para mim. 
Essa flor a pender no vazio da plateia que abandonou o Mimo.
Hertz despedido da sua função de mensageiro. 
Fios desligados.
Marionetas livres da tirania dos cordéis do som. 
Promessas cumpridas. 
O descoração.


terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Deep Inside


 
Well you know what it's like, when you feel light-headed
And the sun is reflecting in her eyes
And the touch of her skin, feels like summer
And the warmth that you feel comes as no surprise

Taking her clothes, feel her tremble, just go with what you feel
As the world disappears
You're sinking inside her, inside her

Well you know that it's like when it all goes quiet,
And the sun is reflecting in her eyes
And the touch of her skin, feels like heaven
And if you asked, would she stay with you a while

Taking her clothes, feel her tremble; just go with what you feel
As the world disappears, you're sinking inside her
Inside her... (inside her)

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

A construtora de lares

Na minha frente, uma vez mais e pela décima sétima vez, o cenário apocalíptico da minha existência material enfiada em sacos do lixo, à espera de um camião que a recolha e a descarregue em qualquer outro lugar.