Esta manhã, quando estava sentada à mesa do pequeno almoço a beber sumo de laranja, Gualtiero, o Italiano, que agora está convertido numa espécie de secretário pessoal e assim permanecerá até arranjar um mainato mais apropriado, veio avisar-me que hoje é o aniversário da minha irmã.
Pedi imediatamente o meu papel de carta roubado do Ritz e comecei por escrever a seguinte mensagem:
Querida irmã,
Comprovando o axioma de Tolstoi na abertura das páginas de Karenin, somos iguais a todas as outras famílias. Nunca agradecemos a normalidade porque a concebemos como um direito natural. Mas é a fonte do nosso mais oculto poder. Aquilo a tu chamas o poder do sangue. Aquilo a que eu chamo a rede. O factor invisível subjacente a todas as equações de risco. A estrutura de que são feitas as asas. A consistência do chão que suporta os passos. A mão que embala o berço. O gene do amor partilhado no ADN.
Era uma carta sincera. Mas entretanto fui interrompida pelo bárbaro cozinheiro Viking que, como é seu hábito, plantou-se atrás de mim com a cabeça encostada ao meu pescoço e, dispensando os níveis mínimos de descrição, começou a soletrar a minha mensagem enquanto ia tingindo de perdigotos o fino papel do Ritz.
Quando finalmente terminou, olhou para mim com um ar seriamente preocupado e perguntou-me:
- Què?? Precisas dum rim????
Perante isto, achei mais conveniente limitar-me a um SMS com a palavra parabéns seguida por cinco ou seis pontos de exclamação...