De imediato, a deusa vai à mansão da Inveja, imunda
de negro pus. A casa feia estava escondida no fundo
de um vale, sempre sem sol, que jamais o vento tocara,
uma casa triste, toda a abarrotar de um frio entorpecedor,
onde o lume falta sempre e sempre abunda a escuridão.
Quando a virgem viril, temível na guerra, ali chegou,
parou diante da casa (nem lhe era permitido na morada
entrar), e bate à porta com a ponta da lança.
Ao bater, as portas escancaram-se. Lá dentro vê a Inveja,
banqueteando-se com carne de víbora, com que alimenta
a sua maldade; ao vê-la, desvia o olhar. Esta, por seu lado,
levanta-se da terra infértil, deixando pelo chão bocados
de víboras meio-comidas, e avança com passo indolente.
Ao ver a deusa, deslumbrante pela beleza e as armas,
lançou um gemido e contraiu a face, soltando suspiros.
A lividez cobre-lhe o rosto, todo o corpo é escanzelado;
o olhar nunca é frontal, os dentes amarelados de sarro,
o peito esverdeado de fel, a língua encharcada em veneno.
Jamais um riso, a não ser quando vê alguém sofrendo,
jamais dorme, agitada por angústias que a fazem desperta.
Com desagrado vê os sucessos dos homens, e, ao vê-los,
definha; e rói os outros e também a si própria se rói,
e este é o seu tormento.
Ovídio, Metamorfoses, Livros Cotovia