terça-feira, 22 de setembro de 2015

Diário de Bordo

Ando há três dias muito entretida com um maravilhoso engenho que um dos ex presidiários trouxe de presente a Andrhirmnir, o cozinheiro viking, após umas breves férias no seu antigo estabelecimento prisional. 
É uma coisa feita em plástico branco e transparente que tem uma espécie de cúpula em espiral. Liga-se a coisa à corrente, pressiona-se metades de laranja contra a espiral e depois, como que por magia, nasce sumo de laranja na peça em forma de jarro que fica na base do engenho.
Apesar de nunca ter perdido muito tempo a pensar no assunto, por alguma razão inexplicável, estava convencida que o sumo de laranja natural era uma coisa que se fazia nas fábricas através de um complexo sistema de composição química.
Fiquei tão entusiasmada com a máquina que confisquei-a imediatamente ao viking e mandei comprar cem quilos de laranjas para me abastecer de um barril de sumo. Quis recompensar o ex presidiário dando um jantar em sua honra se não pela invenção do instrumento, pelo menos pelo feito de o ter descoberto. Mas mudei de ideias quando o resto da tripulação me garantiu que aquilo é uma coisa que se obtém em qualquer bomba de abastecimento de combustível à troca de uns cartões de pontos que também não sabia existirem e que se ganham comprando o dito do combustível. 
O episódio não me retirou o prazer de fabricar o meu próprio sumo de laranja, inchando-me com uma euforia autosuficente que imagino semelhante à que sentem as pessoas que conseguem caçar o seu próprio jantar. 
Contudo, acordou em mim a leve suspeita de uma certa incapacidade de sobrevivência no chamado mundo real, após tantos anos, digamos que quase todos, de uma existência vivida dentro das páginas de um livro. 
Enquanto espremia compulsivamente o décimo quilo de laranjas, movida por uma curiosidade mórbida, tomei a arriscadíssima decisão de fazer uma viagem exploratória à realidade dos Homens. Não que tenha alguma intenção de viver nela, que as notícias que me chegam estão longe de me provocar tal inclinação, mas apenas para me certificar de que não perco nenhuma maravilha.
Ainda não descobri o melhor processo de fazer tal expedição já que até eu, com as minha evidentes limitações, sei que não posso chegar a um aeroporto e pedir um bilhete de avião para a realidade. Ainda assim, depois de expor as minhas angústias a esta brava tripulação Pirata, segui o conselho da maioria e comprei uma televisão. De acordo com o que me disseram, ninguém está habilitado a sobreviver no mundo real se não consumir, pelo menos, quatro horas diárias de televisão por cabo.

3 comentários:

  1. Já eu diria que ninguém está habilitado a sobreviver no mundo real se consumir, quatro horas diárias de televisão por cabo.
    Estou na fase de viver dentro das páginas de um livro.
    ;)

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    1. O que me disseram, querida Uva, é que agora viver é imitar aquilo que se vê na tv!!!

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  2. Querida Capitã Cooka. Aconselho vivamente que desista da expedição à realidade dos homens. Diz-se que por lá só se encontram Piratas da pior espécie.
    Nem tomam sumo de laranja, só G&T com frutos vermelhos !!!!

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