Saí para ver a primavera e encontrei aberta a minha praia.
Por aqui é assim que se mede o tempo. A ninguém importa que ainda agora chova ou que ainda ontem o frio. Faz tudo parte de um passado que queremos esquecer. Quando abre a praia ouve-se bossa nova com Sakamoto no piano. Ainda é cedo para o reggae e a água do mar faz frieiras nos dedos dos pés. A hortelã aparece aos molhos nos supermercados e ficamos a saber que chegou a altura de trocar o vinho tinto pelo gin. A empregada virá para sacudir as mantas e abrir as janelas e há de afugentar o inverno das paredes desta casa arrastando-o com a vassoura. As meias, as botas e os casacos serão escondidos em baús fechados e eu passarei frio durante mais um mês e ficarei constipada e direi com alegria que é a rinite da primavera. Amanhã, todos os restaurantes estarão abertos e a praia cheirará a peixe assado e a óleo de côco. É preciso fazer desaparecer estas pilhas de livros e comprar a biblioteca de verão. Tenho um dia para substitui o Guerra e Paz por qualquer coisa da Virgínia. Começo sempre a primavera com Virgínia.
Esperar-me-á em vão, numa casa encerrada, o fim de inverno de Lisboa.
Reabriu a minha praia e tudo o mais faz parte de um passado que queremos esquecer.
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