Andhriminir, o cozinheiro pirata, trouxe-me a carta juntamente com a omelete de espargos. Levantei o sobrolho direito para que percebesse que tomei nota de duas manchas de gordura que reproduziam na perfeição as impressões digitais do Viking psicopata. Ignorou-me e ficou ali especado a respirar por cima do meu ombro, à espera que abrisse o envelope.
O papel era de um azul institucional, irrepreensível, escrito com tinta preta provavelmente aprovada por duas ou três diretivas comunitárias e numa letra quase demasiado perfeita para ser de origem humana. Um leve a aroma a Hermès reavivou-me a memória das células da medula. Instintivamente, endireitei as costas; puxei a saia para baixo numa tentativa inútil de tapar os joelhos; repreendi-me os sapatos sem saltos; tomei consciência do cabelo desgrenhado e da manicure imperfeita; constatei que já não me lembro do nome das capitais de todos os países da costa africana e envergonhei-me pelo facto de os talheres pousados na mesa nem sequer serem de prata.
O remetente escreveu no local do destinatário o meu nome completo, trabalho a que só se dariam os credores, o fisco, a justiça e o meu ex-homem. E destes, é certo e sabido que só o último teria eficiência e meios para me localizar em alto mar, algures entre as águas de Espanha e de França.
Segurei a carta com a ponta dos dedos num gesto que um medíocre psiquiatra poderia identificar como o receio de poluir o ambiente da proveniência e outro medíocre psiquiatra seria capaz de garantir representar a relutância da auto-contaminação.
Tomei-lhe o peso na palma da mão. É o gesto atávico correspondente à ancestral consulta dos oráculos.
Mas depois, ainda com as costas direitas e com a respiração de Andrhirmnir a oxidar-me o colar de prata, os músculos do meu braço conspiraram num espasmo involuntário que atirou com o envelope borda fora do navio.
Cruzei os olhos com a expressão amuada do cozinheiro e Viking e enquanto devorava a omelete com as mãos, ouvi-me dizer com a boca cheia:
- ohhh ... caiu ao mar.
Mas, mas... de espargos? Em alto mar? Espargos... de (glup) conserva?
ResponderEliminarNão admira...
Mas claro que não, caríssimo. Toma-nos por bárbaros lá por termos enfiado o faqueiro de prata no prego?? Temos uma pequena horta no convés. (Temos tudo no convés e todas as ações se passam no convés, como já deve ter reparado)...
EliminarEsses vikings além de nomes impronunciáveis são de um descaramento sem precedentes. Ao menos esse sabe que um viking deve estar no mar, ao contrário de outro que se acha agricultor e pastor. Dai-me paciência e já enchi a dele e talvez tenha voltado a velejar porque ... voou borda fora. Precisa de mais tripulação viking? Este sabe apanhar salmão mas tem a mania que o bacalhau tem bandeira viking (dai-me paciência). Mas regra geral basta ficarem quietos e calados a fazer peitaça, caso contrário, podem dançar na prancha, voando como gaivotas.
ResponderEliminarCaro anónimo, ia agora mesmo postar um anúncio a recrutar un viking capaz de pescar salmões à unha. Tem-me feito imensa falta.
Eliminarbom dia! só para lhe dizer que gosto tanto de ler o que escreve. queria que o soubesse :)
ResponderEliminarBom dia, Ana!
Eliminar:)
oh pah, Capitã Cooka, nunca saberemos se era da Santa Casa da Misericórdia a anunciála única premiada com o Jackpot do Euromilhões!!!
ResponderEliminarAssim já podia comprar a Grécia e transformá-la numa Tortuga Mediterrânica !
Calculo a irritação do Andhriminir ! Até eu estou piursa e nem estou besuntada de óleo nem nada !!! :)
*anuncia-la... esta coisa dos correctores é cabalística no mínimo....
EliminarNão era, que a Santa Casa da Misericórdia não cheira a Hermés!
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