quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

A página 666

Diz assim, na página 666 dessa que é a minha bíblia, de capas escuras e pesadas, mas de letras feitas de nuvens:


"agora se tivesses alma tinhas de salvá-la, agora
se tivesses génio tinhas de resgatar o pacto, agora
que não tiveste senão quotidiano terás de trazer muita da luz sumida 
pelo mundo fora à tua roupa: camisa, calças,
sapatos leves com os pés andando
junto às águas salgadas,
não em cima delas, 
com tanta luz no teu passeio distraído pelos acessos à memória,
águas salgadas batidas, 
a tua altura medida em espuma contra as fráguas,
agora tens de saber que é falsa,
vens pela babugem como um peixe meio dentro meio fora,
guelras aflitas e o ar enorme à volta para arvoar,
não fossem as barbatanas"

Diz assim, e é verdade. 


2 comentários:

  1. «Se tivesse de recomeçar a vida, recomeçava-a com os mesmos erros e paixões. Não me arrependo, nunca me arrependi. Perdia outras tantas horas diante do que é
    eterno, embebido ainda neste sonho puído. Não me habituo: não posso ver uma árvore
    sem espanto, e acabo desconhecendo a vida e titubeando como comecei a vida. Ignoro
    tudo, acho tudo esplêndido, até as coisas vulgares: extraio ternura duma pedra.»

    Há Raul em Herberto.

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    1. Podia bem ser a segunda parte dos primeiros versos. Que maravilha...

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