Não gosto de despedidas. O ar lamechas fica-me mal. Por alguma razão estranha, as palavras da praxe, por mais verdadeiras que sejam, quando ditas por mim soam aos diálogos dos filmes portugueses dos anos oitenta. A minha hesitação em tocar nas pessoas acaba sempre em abraços desajeitados, iniciados pelos outros, durante os quais eu me concentro numa forma digna de lhes pôr um termo.O facto de ter um choro difícil e uma despropositada ironia não ajuda.
Para mim, as despedidas são uma catástrofe relacional. Tanto as pequenas como as grandes.
Nas festas, há muito que me habituei a despedir-me apenas dos anfitriões, esperando os raros momentos em que estão sozinhos.
Na vida, prefiro afastamentos civilizados a despedidas efusivas.
Hoje saí de casa com a missão secreta de me despedir de algumas das mais de cinquenta pessoas que habitam o meu local de trabalho.
Não saber praticamente nada sobre a vida desses que me rodearam, aliado à circunstancial inexistência de nostalgia, privilégio de quem acredita partir para melhor, faziam adivinhar uma despedida fácil.
Três frases formais e um aceno profissional.
Hoje passei o dia a adiar o instante em que sairia do meu gabinete para cumprir a missão secreta de me despedir de algumas das mais de cinquenta pessoas que habitam o meu local de trabalho.
Adiei-o tanto que chegou a hora em que todos os outros abandonaram o edifício e partiram para as tais vidas pessoais que eu desconheço completamente.
E quando o edifício ficou estranhamente vazio, e pela primeira vez meu, passeei-me pelos corredores com uma daquelas caixas que se usam nos momentos das despedidas profissionais, nos filmes americanos, perguntando-me se amanhã alguém vai notar a minha ausência.
O alívio da impossibilidade do cumprimento da minha missão secreta, fez-me baixar a guarda e por um momento, a sós, consegui dizer um adeus condigno a uma fase da minha vida.
Ou assim achava eu, até chegar ao parque de estacionamento e encontrar a única pessoa de quem não me queria despedir.
Faltaram as três frases formais, o aceno profissional e até a ironia e o abraço desajeitado.
Ficámos ali um a olhar para o outro. E eu, pela primeira vez na vida, a lamentar ser tão má nas despedidas. Não saber dizer as coisas certas no tom credível, não conseguir tomar a iniciativa de abraçar as pessoas. Ser de choro difícil.
E depois, entrar no carro com um nó na garganta.
Deste-me um abraço inestimável, que nunca vou esquecer.
ResponderEliminarE muitas vezes ajudas a afrouxar o nó que trago na garganta.
É como diz a música música brasileira: "aquele abraço".
ResponderEliminarcaríssima cuca:
ResponderEliminarhá uma coisa de que está em absoluto proibida de se despedir, seja de que maneira for: a de escrever textos neste blog... então até amanhã!!
Fritz: ela não deixará de cucar.
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