sábado, 15 de agosto de 2015

Desmorte

Procurámos os indícios nas frases dos primeiros, como se Herodoto, Esopo ou Homero contivessem o mistério da primeira rosa. 
Depois buscámos a explicação nos clássicos e diante do seu desprezivo silêncio exigimo-la aos românticos. 
Mas, nesse altar, apenas encontrámos o desespero que tentámos aliviar com os poetas. Os versos são fraco paliativo da febre quando a pele não cabe numa metáfora.
Os contemporâneos remeteram-nos para Chuang Tzu e este para um intolerável palácio de acasos. 
Inconformados, batemos à porta da ciência onde nos oferecemos para todos os programas experimentais ainda não inventados pelo homem e já condenados pelos deuses. 
Percorremos o mundo sem que em nenhum deserto ou oásis nos hajam sabido libertar da peste azul.
Na minha desmorte, resta-me, pois, concluir que é tudo uma grande estupidez. 


2 comentários:

  1. (...)
    Se a noite cai agora sobre a rosa passada,
    e o dia de verão se recolhe
    ao seu nada, e a única direcção é a própria noite
    achada? De pulmões às costas, a vida
    é tenebrosa. Morte é transfiguração,
    pela imagem de uma rosa. E o poeta pernalta
    de rosa interior dá à pata nos pedais
    da confusão do amor.
    Pela noite secreta dos caminhos iguais,
    o poeta dá à pata como os outros animais."

    Herberto Helder

    ResponderEliminar