domingo, 26 de dezembro de 2010

Os malefícios do ego

Dois vale mais do que um. Um é melhor do que quatro. Três pode ser demasiado ou o bastante. Cinco é levar as coisas demasiado longe. Seis é delírio.
Avança agora, viaja cada vez mais fundo nos subterrâneos do seu próprio nada, o lugar nela coincide com tudo o que ela não é. O céu por cima dela é cinzento ou azul ou branco, por vezes amarelo ou vermelho, outras vezes roxo. A terra sob os pés dela é verde ou castanha. O corpo dela situa-se no ponto de junção entre a terra e o céu, e pertence-lhe apenas a ela e a mais ninguém. Os pensamentos dela pertencem-lhe a ela. Os desejos dela pertencem-lhe a ela. Encalhada no reino do um, invoca o dois e o três e o quatro e o cinco. Por vezes o seis. Por vezes mesmo o sessenta.”

Paul Auster in Sunset Park, Asa

Terminei o livro ontem à noite e a dificuldade que tive em encontrar um trecho que gostasse o suficiente para colocar aqui demonstra que não foi ainda neste livro que me reconciliei com Paul Auster.
Paul Auster sempre me fascinou pela capacidade de criar personagens enclausuradas dentro de si próprias, a bater com a cabeça de encontro às paredes do labirinto que é a vida real. Apesar de Sunset Park manter esse registo, Auster tem a infeliz ideia de nos explicar a fórmula. Não gosto de narradores transformados em tradutores de angústias a retirar-nos a possibilidade de uma identificação directa. Já não temos que apanhar com a história da sua vida, mas continuamos a ter que apanhar com ele no livro, a contar a história.
O que aconteceu ao génio de Mr. Vertigo e In The Country of Last Things? Aconteceu-lhe o ego, suspeito.
Perguntam vocês: Cuca, se ficaste decepcionada com o livro porque escreves sobre ele? Para que a Estrelita saiba que já o li e não me ofereça. Evidentemente.

2 comentários:

  1. Cidade de vidro em versão graphic novel:

    http://www.asa.pt/produtos/produto.php?id_produto=998010

    Se não gostar do género, comece por este que muda logo de ideias:

    http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12593

    Um bom ano de 2011 às estrelas e restantes criaturas.

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  2. A criatura de serviço agradece por si pela estrela, pela outra criatura e também lhe deseja um bom ano.

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