Não. Não é assim romântico, à Herculano.
Morreste naquele instante. Em que eu te matei. Só depois percebi que foi premeditado. Porque tinha que ser assim. Porque tentaste; bastou isso. Foi a tentativa que te matou, entendes?
Cravaste a faca mas não torceste. Ficaste satisfeita apenas com o esforço da perfuração. Deixaste-a lá. Não a puxaste. Não sangrei. Fiquei assim, a olhar para ti, meses e anos enquanto as tuas pupilas perdiam cor.
Até que consegui balbuciar o anúncio de que tinhas morrido – já estavas podre até aos ossos quando te guardei.
Ficaste menos alta assim, morta. Ficaste feia. Nem te concedi a graça de seres um fantasma.
Revoguei todos os perdões que te dei.
Acabei contigo assim. O que sobrou está num ossário ordinário qualquer e não sei o número da tua gaveta.
Descobri que tenho vocação para SOL. Não mais orbitei ninguém.
Gostei muito. Faz-me lembrar um texto que escrevi sobre a minha própria morte:
ResponderEliminar"Um dia, à tarde, li no jornal que tinha morrido. Nem eu próprio acreditei.
Não chegou a haver fotográfos, entrevistas, nada! Fiquei desiludido. Muito desiludido.
Fiz as malas calmamente (contudo esqueci-me de uma gravata) e parti com lágrimas nos olhos."-SA, 12 Janeiro 2009.
@ Solidão, duas observações: 1. obrigada por gostar muito do meu cadastro; 2. para cadáver o seu blog mexe bastante...
ResponderEliminarTão bom continuo a ouvir o raio da portão do cemitério a chiar de cada vez que leio o post...
ResponderEliminar@ Cuca: mas de certo sentes o imenso Sol a torrar-te as costas!
ResponderEliminarMedusa: lembro-me ainda de outro texto antigo: "Já morreste mas ainda não me consegui livrar do teu cadáver".
ResponderEliminar`Relativamente ao rigor mortis do meu blog, vou-te dizer (sim, vou tratar-te por tu), que estou vivo, graças a um blog morto.