Tenho poucos pequenos prazeres.
Sempre invejei aquelas pessoas que nasceram com o dom de conseguir que o pôr-do-sol lhes arranque um sorriso, que a folha que lhes cai no nariz e inicia o Outono não passe sem ser notada, que têm o dia feito pelo facto de ligarem o rádio do carro no preciso instante em que se inicia a sua música preferida, que vêem no olhar curioso de uma criancinha um sinal de esperança que melhora uma aflição qualquer.
Estes são os donos do mundo. O seu bem-estar depende de coisas tão poucas e acessíveis como o abanar da cauda do gato do vizinho. Podem nunca ter lido um livro de poesia mas vivem-na dentro de si.
A mim, os prazeres saem-me sempre caríssimos e nunca são pequenos.
Os filmes podem ser muito bons mas falta-lhe um final à altura, os livros podem ser inesquecíveis mas a tradução é má, o hotel pode ser maravilhoso mas há um mais caro, a comida pode estar excelente mas com outro vinho teria ficado melhor e a conversa até pode ser celestial mas a sandália direita apertava-me o pé.
As pessoas como eu, quando descobrem um pequeno prazer agarram-se a ele como se a sua vida dependesse disso porque sabem que poderão passar anos até voltarem a descobrir um novo comprimido prozac em versão barata, não aditiva e isenta de culpas.
Tive, durante muitos anos, um pequeno prazer secreto que era atravessar a ponte Vasco da Gama para entrar em Lisboa.
Se fosse de manhã, Lisboa apareceria à minha frente em tons azulados, a irradiar esperança e vida, carregada do optimismo das coisas que são movidas por algo maior que nós. Se fosse de tarde, Lisboa embrenhada num tom dourado, como uma cidade abandonada a si própria far-me-ia lembrar o gosto que têm todas as coisas quando dentro delas se sente o cheiro do voltar a casa. E de noite, então, a Lisboa carregada de promessas, em que as luzes se confundem com os sonhos e tudo nos parece possível é uma sensação avassaladora que foi, provavelmente, o meu maior pequeno prazer.
Seis meses depois de cinco vezes por semana ser obrigada a passar pela ponte Vasco da Gama para entrar em Lisboa, constatei com infelicidade que, à força de tanto o viver, o meu antigo pequeno prazer se transformou em dez irritantes minutos em que carrego no acelerador para que passem o mais rapidamente possível.
Espoliada no meu parco património de instantes prozac, praticando a apregoada filosofia de me queixar a toda a gente, hoje ao almoço decidi partilhar a minha desventura.
Quatro pessoas concluíram da seguinte forma:
- Talvez não tenhas sido feita para o casamento.
Sempre invejei aquelas pessoas que nasceram com o dom de conseguir que o pôr-do-sol lhes arranque um sorriso, que a folha que lhes cai no nariz e inicia o Outono não passe sem ser notada, que têm o dia feito pelo facto de ligarem o rádio do carro no preciso instante em que se inicia a sua música preferida, que vêem no olhar curioso de uma criancinha um sinal de esperança que melhora uma aflição qualquer.
Estes são os donos do mundo. O seu bem-estar depende de coisas tão poucas e acessíveis como o abanar da cauda do gato do vizinho. Podem nunca ter lido um livro de poesia mas vivem-na dentro de si.
A mim, os prazeres saem-me sempre caríssimos e nunca são pequenos.
Os filmes podem ser muito bons mas falta-lhe um final à altura, os livros podem ser inesquecíveis mas a tradução é má, o hotel pode ser maravilhoso mas há um mais caro, a comida pode estar excelente mas com outro vinho teria ficado melhor e a conversa até pode ser celestial mas a sandália direita apertava-me o pé.
As pessoas como eu, quando descobrem um pequeno prazer agarram-se a ele como se a sua vida dependesse disso porque sabem que poderão passar anos até voltarem a descobrir um novo comprimido prozac em versão barata, não aditiva e isenta de culpas.
Tive, durante muitos anos, um pequeno prazer secreto que era atravessar a ponte Vasco da Gama para entrar em Lisboa.
Se fosse de manhã, Lisboa apareceria à minha frente em tons azulados, a irradiar esperança e vida, carregada do optimismo das coisas que são movidas por algo maior que nós. Se fosse de tarde, Lisboa embrenhada num tom dourado, como uma cidade abandonada a si própria far-me-ia lembrar o gosto que têm todas as coisas quando dentro delas se sente o cheiro do voltar a casa. E de noite, então, a Lisboa carregada de promessas, em que as luzes se confundem com os sonhos e tudo nos parece possível é uma sensação avassaladora que foi, provavelmente, o meu maior pequeno prazer.
Seis meses depois de cinco vezes por semana ser obrigada a passar pela ponte Vasco da Gama para entrar em Lisboa, constatei com infelicidade que, à força de tanto o viver, o meu antigo pequeno prazer se transformou em dez irritantes minutos em que carrego no acelerador para que passem o mais rapidamente possível.
Espoliada no meu parco património de instantes prozac, praticando a apregoada filosofia de me queixar a toda a gente, hoje ao almoço decidi partilhar a minha desventura.
Quatro pessoas concluíram da seguinte forma:
- Talvez não tenhas sido feita para o casamento.
gostei.
ResponderEliminarabraço
SA
1. Cuca foi feita nas estrelas.
ResponderEliminar2. Essa gente que é descrita nos 2.º e 3.º parágrafos não existe; mas existe gente que finge muito que é feliz.
3. Ninguém come mousse de chocolate todos os dias, por mais que goste.
4. Sinto pena do casamento dessas quatro pessoas.
A única coisa que devemos exigir ao prazer, grande ou pequeno, é que cumpra tudo o que promete.
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