E no entanto, não sabemos nada e a biblioteca está vazia. É que a pirataria, embora receba alento da história, só aspira a livrar-se dela. Quando os flibusteiros se fazem ao mar não será que fogem à todo o pano da história? Trocar a terra pelo oceano não é uma decisão insignificante: implica despedir-se da cidade e da sociedade, do discurso do método, do tempo das clepsidras ou dos relógios, das escalas nos portos, do esquadro, da colher de pedreiro e do compasso, das fábricas e dos campos, do código civil e dos arquivos, dos antepassados, das crianças, do passado e do futuro. E pressupõe substituir-se o ambiente em que se nasceu por outros ambientes menos conhecidos: o espaço vazio e circular onde o homem ainda não traçou as suas geometrias e as suas cidades, o indiferenciado, o tempo sem costura da lua e do sol, a paisagem lagunas do início do mundo ou da sua conclusão, o ciclo das estrelas no céu, a roda do eterno recomeço e do Grande Ano. É isso que balbucia a tentação pirata;
Gilles Lapouge, in, Os Piratas, Antigona
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