domingo, 13 de novembro de 2016

Irrazão

«A irrazão derrota-se a si mesmo», disse Ibn Rushd a Ghazali, pó ao pó, «devido à sua irrazoabilidade. A razão pode fazer uma soneca por algum tempo, mas o irracional está na maior parte das vezes em coma. No final, será o irracional a ficar para sempre enjaulado em sonhos, enquanto a razão vencerá.»
«O mundo com que os homens sonham», respondeu Ghazali, «é o mundo que tentam fazer.»

Salman Rushdie, Dois Anos, Oito Meses e Vinte e Oito Noites, D. Quixote, pg. 158, 159.

10 comentários:

  1. Sim...e os problemas surgem da incompatibilidade onírica... para mim, faz todo o sentido.
    Boa noite, Capitã Cuca.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Acho que o maior problema é este:

      http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.pt/2016/11/o-rumo.html?m=1

      Eliminar
    2. Hum, hum, mas a capacidade para consumir, ter coisas, como derradeiro caminho para a tal felicidade (que também dizem que é o que a humanidade verdadeiramente busca, a felicidade) também não terá sido a forma como em determinada altura "os homens sonharam o mundo" (alguns) e o texto que acabei de ler não será a descrição do que acabou por acontecer, as consequências da passagem desse sonho para a prática?.
      O ócio é apedrejado há muito tempo, chamam-lhe preguiça, pecado, criminoso, se as pessoas tivessem tempo para pensar, também tinham mais tempo para sonhar e não abdicariam tão facilmente dos próprios sonhos para aderir aos sonhos alheios.

      Eliminar
    3. Acho que a ordem cronológica dos últimos 50 ou 60 anos é mais ou menos assim: o homem começou por lutar por ter tempo. Quando conseguiu um pouco de tempo começaram a vender-lhe coisas. Então passou a lutar por ter coisas. Para isso deixou de ter tempo. E agora luta para pagar as coisas que afinal nunca pode ter e perdeu a batalha pelo direito ao tempo.
      Nada disto seria tão grave se "os donos disto tudo" , que sempre os terá de haver, não fossem eles próprios tão pouco pensantes e por razões que pouco têm a ver com falta de tempo..,

      Eliminar
  2. Embora desconheça em que fase bibliográfica de Salman se insere a obra em apreço, - se na da "literatura técnica para as elites de inteligência superior", se já na da decadente "divulgação científica para badamecos"-, suspeito tratar-se este de um tema bastante controverso lá para os lados do Convento de Rilhafoles.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. No último romance.
      A fase em que o Rushdie está farto que não o leiam e decidiu escrever um romance Pop.

      Eliminar
    2. (Mas depois lá lhe foge o pé para o génio e tem tiradas assim a propósito de um diálogo entre dois filósofos mortos)

      Eliminar
  3. E estás a ser Snob, Lady Kina! Não devemos chamar badamecos às pessoas que não têm paciência para livros com muitas letras...

    ResponderEliminar
  4. Reconheço pertinência à observação da Lady Kina. Isso parece-me já ter sido escrito com mais elegância e menos palavras. Pó ao pó também pode ser autobiográfico.

    A razão é sobrevalorizada. Se dependesse da nossa consciência não conseguiríamos dar um passo, deglutir, escrever, tocar piano.

    Tantas vezes, não é a razão um mero diário dos nossos desejos?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Nessa matéria sou suspeita. Tenho uma declarada preferência pela razão.

      Eliminar