sábado, 6 de agosto de 2016

Houve aquela tarde

Nunca consegui ensiná-lo a ver, não para além, mas através do aparato. 
Sentados no chão de terra batida, joelhos nus, mãos sujas, olhos límpidos, o sol a esvair-se para lá da montanha, eu a afiançar que podia ser apenas aquilo e ele ensurdecido pelo inoportuno tilintar das minhas pulseiras. 
Demorei muito tempo a perceber quão escura e densa é a cortina do aparato. Depois aprendi a amá-la. Daquela maneira como se ama a pequena cicatriz que se trouxe de lembrança de uma guerra que não foi ganha nem perdida. 

3 comentários:

  1. As mulheres não deviam usar pulseiras. Assim não conseguem ensinar nada, e nunca se sabe quando é preciso.

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  2. Creio que se não fossem as pulseiras seria o cintilar dos olhos, o brilho do cabelo ou o último raio do sol. É inevitável existir sempre um elemento desviante quando não se quer ouvir o essencial.

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  3. Acho que as pessoas não deveriam ter de ensinar nada.
    Toda a gente devia ser autodidata.
    Beijos a ambas.

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