sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Diário de Bordo

Quando a minha tripulação vê o mês de agosto formar-se no horizonte, deixa de ser intrépida e valorosa e entrega-se à compulsão nacional burguesa que consiste num irresistível impulso para se enfiarem todos dentro de uma marina algarvia.
Foi assim que há cerca de 15 dias, rumando eu na direção da Noruega,  reparei que sempre que me afastava do leme, o navio, como se com foros de vontade sua, assumia imediatamente a rota algarvia. 
Uma noite, o Garcia Márquez e o seu livro de contos aliaram-se a esta tripulação viciada e viciosa, fazendo com que me distraísse no convés por largas horas. 
Adormeci com os pés civilizadamente frios, enrolados numa manta de arminho, e tive um pesadelo com mares sem cheiro.
Acordei afogada num charco de calor africano; mordeduras de melgas entre os dedos; pregões de bolinhas com e sem creme; a costa do Algarve, que estaria à vista, se não estivesse coberta por gente estendida nos areais... 
A minha tripulação, é claro, já se havia disperso por creparias, italianos, lojas de quinquilharia recordacional, saltitando feliz e veraneante entre as ondas e os pés do vizinho. 




7 comentários:

  1. burro?! então mas aquilo não eram puros lusitanos??



    /Olhos de cão azul?/

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  2. Finalmente alguém que não tenta negar o nosso supremo poder: o de caminhar sobre as águas!

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    1. Mas há incréus que tentam negar essa evidência??? Ingratos!

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  3. já nã se arranja tripulação como antigamente...

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  4. tanto tempo naufragado, um parco lenho por companhia, gravado a custo com aquelas que desesperei serem as minhas últimas memórias, e nem um honesto pirata à vista no vasto oceano. está explicado. nestes tempos hodiernos de clima inclemente até um bom velho lobo do mar cede ao hedonismo das águas suaves e noites quentes...

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