sábado, 5 de outubro de 2013

Notícias da terra


 Estávamos sentados à mesa no convés quando Polly, o papagaio emprestado (que certamente por não ser nosso é o único animal que ainda alguma utilidade vai tendo neste navio), deixou cair no meu colo um sobrescrito com um logotipo familiar, em todos os sentidos do termo. 
A minha gente, decorridos três meses desde que me tornei pirata, começou a desconfiar que aquela  história da licença sabática para fazer um doutoramento sobre a organização política dos povos do reino de prestes joão talvez não faça muito sentido. Dizem-me que os almoços de domingo têm andado empobrecidos com a monocromática orientação política das conversas, que não há quem coma a morcela do cozido à portuguesa e que à falta de terem alguém a quem mandar endireitar as costas de dois em dois minutos tiveram que começar a tomar as refeições de televisão ligada. Pedem-me que volte e prometem-me que não me obrigarão a regressar ao trabalho, a que eles insistem em referir-se como "a função", para fazer com que pareça mais importante do que é. 
Não me deixarei enganar. Tenho um considerável histórico de fugas de casa. Desde os quatro anos que ando nisto e a única coisa que mudou foi o objeto da promessa daquilo que não me obrigarão a fazer. Além disso, mesmo que quisesse voltar não podia. Eu e esta brava tripulação ainda só roubámos uma velha traineira de pescadores e, tendo jantado o espólio, o lucro da empreitada não chegaria para pagar a conta do leasing do navio. 
Pese embora a carta não tenha beliscado a minha firme de convicção de morrer Pirata, deixou-me submersa na nostalgia dos tempos em que em que era uma cidadã exemplar e me levantava todos os dias às sete e meia da manhã para ir praticar o bem. 
Mas meio minuto depois passou-me. Agora que sou terrorista dos mares, faço parte do mal. E se há coisa que sempre gostei é de pertencer a equipas com alguma possibilidade de ganhar.

3 comentários:

  1. Entre a nostalgia da morcela do cozido à portuguesa, do regresso à função de costas direitas e a firme decisão de ser o terror dos 7 mares e uns trocos, está a responsabilidade e de segurar o leme da existência da turba bucaneira, da Blogo -curiosa-de-patifarias e dos restantes animais racionais e dos outros, que a seguiram nesta empreitada e lhe são devotos e leais. Para fazer valer a sua irrevogável decisão como a acertada que foi, precisa urgentemente definir um alvo que traga dividendos à tripulação da embarcação. Como os valores ultimamente não valem nada, será árdua a tarefa, mas seguramente levada a bom porto pela valorosa Capitão Cooka !

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  2. Estamos já a tratar desse assunto. Vamos ter uma batalha em breve.

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  3. E para quando a batalha?
    Dará tempo de mandar fazer um autefite em dalmatês?

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