terça-feira, 1 de maio de 2012

Pensão Amor


Quando a rotina dos teus dias te ensopa os ossos olhas para a tua vida com desdém. Sentas-te num sofá comprado na loja sueca e imaginas o que serias se tivesses escolhido o caminho da esquerda. O do coração. Nos sonhos nunca se sente a falta do que já se tem. É por isso que o caminho que não escolheste tem o suave aroma das figueiras num fim de tarde de sol. Então tornas-te vítima do teu logro e finges que estás a tempo de voltar atrás. Móis a decisão durante uns dias, juntas-lhe três doses de otimismo e regas tudo com um copo do teu melhor whiskey.  É nessa altura que o meu telefone toca.
A tua voz nas minhas sucessivas salas soa como uma nota de constância confortável. Mais ou menos como a paisagem do quadro que arrastamos pela vida fora e vamos pendurando em paredes diferentes. Descreves-me como seria o mundo se tivesses escolhido o caminho da esquerda. O do coração. Transponho-me para a tua ilusão com a certeza que durará o tempo de um sonho. Alugas-me pelas horas indispensáveis ao regresso ao cruzamento em que tornarás a escolher o caminho da direita.
Presto-te o serviço da fantasia da liberdade que tu me pagas com a fantasia de uma vida normal.

E não admira nada que, para encenarmos o próximo ato desta peça esgotada, tenhamos escolhido por palco um sítio chamado Pensão Amor.

3 comentários:

  1. Cuca, cuca (suspiro) (e um acentuar do descair de ombros)

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  2. Cuca, Cuca...

    (caramba, que havemos de fazer com esta miúda?...)

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  3. pronto, pronto...
    ...eu fico em casa quieta...
    (olhar envergonhado)

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