Entre o cais do sodré e o areeiro o globo terrestre estremeceu e reencaixou-se em torno do eixo. Então, recomeçou a girar. Como se o engenho nunca tivesse estado avariado. Como se os bolos de maçã com canela, os acordes do Moon River na guitarra, a meia lua em forma de sorriso, a marca dos dedos entrelaçados, um peso doce assente nas costas, a foz onde desagua um olhar que vê, houvessem estado sempre aqui. À espera.
sexta-feira, 29 de agosto de 2014
quinta-feira, 21 de agosto de 2014
Voltar
Diz Proust que a ausência, para quem ama, é mais certa, a mais eficaz, a mais viva, indestrutível e fiel das presenças.
Foi assim que percebi, em jeito de momento Eureka, que o regresso desta viagem seria diferente de todas as outras. Só eu parti, mas voltámos juntos.
quarta-feira, 6 de agosto de 2014
sábado, 2 de agosto de 2014
Diário de Bordo
Depois do fracasso do meu romance epistolar com Herberto, o escritor - que descobri ter mais de oitenta anos e que conseguiu partir-me o coração sem que alguma vez, sequer, lhe tenha posto a vista em cima - comecei a pensar que talvez esteja há demasiado tempo neste navio e não seja má ideia ir ver pessoas que não usem tapa-olhos e falsas pernas de pau.
Pretendendo aproveitar para esbanjar todo o conteúdo dos nossos cofres, uma rápida pesquisa no Google fez-me perceber que é em Nova Iorque que o posso fazer de forma mais rápida e discreta.
À primeira vista pode parecer um acto egoísta, mas faço-o em prol da formação espiritual e da saúde da minha tripulação que, desde que enriquecemos com o negócio da venda da caca da baleia, não faz outra coisa a não ser apanhar sol na piscina. Começo finalmente a perceber a que se referem as pessoas que insistem em jurar que o dinheiro é um cancro. No nosso caso, pode vir a ser de pele.
Deixo o comando do navio entregue a Álvaro de Campos, depois de uma aturada reflexão de vários dias que culminou com um-dó-li-tá. Como está quase sempre em coma alcoólico, antevejo aquele nível de anarquia indispensável ao bom funcionamento de qualquer instituição.
Voltarei quando conseguir esbanjar o último dólar.
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