Não passou no teste o lençol de linho grosso com que mandei cobrir os espelhos e a amnésia autoinduzida é frágil panaceia contra a memória da tristeza. E ela surgiu. Não em ondas suaves que nos banham os pés. Como deve ser. Como se suporta. Como diz a literatura. Veio a memória em forma de tsumani. A arrastar objetos e corpos e a submergir-me numa água suja e densa como uma noite sem fim.
O passado estava na sala, sentado à minha frente e de costas para mim.
E então fechei os olhos para que não me pudesse ver. No gesto das crianças e dos inocentes. Fechei os olhos e nadei e nadei e empurrei os objetos e desviei-me dos mortos e regressei à superfície e respirei e penso que devo ter sorrido.
E com o veneno ainda nas veias, penso, penso muito baixinho, como apagar a parte de nós que já não nos serve?